Comportamento de cidadania organizacional: um estudo de regressão linear múltipla na Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM)

Fabio Santos Gouvea

fabio.gouvea@usu.edu.br

Universidade Santa Úrsula, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.

Marcelle Rossi Mello Brandão

marcelle.brandao@usu.edu.br

Universidade Santa Úrsula, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.

Juliano Melquiades Vianello

juliano.vianello@usu.edu.br

Universidade Santa Úrsula, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.


RESUMO

A Gestão de Pessoas nas organizações tornou-se uma tarefa em que envolve cada vez mais um número crescente de variáveis. Para as empresas atuarem em vantagem competitiva é importante que adotem estratégias específicas. As ações e gestos discricionários praticados pelos funcionários nas organizações, e que vão além das tarefas determinadas pelo cargo e função na empresa, são considerados o Comportamento de Cidadania Organizacional (CCO) e que é o tema deste estudo. O objetivo é conhecer em que medida as cinco variáveis propostas por Organ (1988) foram percebidas e identificadas na Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), considerando a opinião dos seus funcionários. A pesquisa, um estudo de caso com uma abordagem qualitativa e quantitativa, envolveu um universo de 1.704 funcionários, que receberam formulários online, contendo 31 assertivas com base nas cinco variáveis de Organ (1988) e obteve 362 respostas válidas. Os dados coletados foram analisados a partir de um modelo de regressão linear múltipla, que desvendou o grau de influência de cada uma das cinco variáveis propostas por Organ (1988) no CCO dentro da empresa. Tal metodologia de análise aplicada a uma empresa pública federal poderia ser replicada em outras instituições para o mapeamento e a gestão dos fatores que mais impactam na geração de um ambiente colaborativo.

Palavras-chave: Comportamento Organizacional; Cidadania Organizacional; Comportamento de Cidadania Organizacional.


INTRODUÇÃO

Barnard (1938) acreditava que a cooperação surgia a partir de cada indivíduo, que tinha como propósito principal se unir em um sistema organizacional diversificado, com pessoas pensando e agindo de formas completamente distintas. Os primórdios dos estudos sobre Comportamento de Cidadania Organizacional (CCO) datam do trabalho deste autor, ao afirmar que os atos de boa vontade e o engajamento dos indivíduos em gestos espontâneos e cooperativos são essenciais para a manutenção da vida da organização.

Os estudos de Katz e Kahn (1966) sobre psicologia social nas organizações contribuíram no sentido de que a teoria organizacional se tornasse livre da estrutura da relação indivíduo-organização, cujas bases teóricas dos estudos da Psicologia e da Sociologia não conseguiram resolver. Este trabalho contribuiu para a formulação das teorias atuais de CCO.

Estudos internacionais e nacionais, da década de 1960 até os contemporâneos, dão ênfase e sugerem que o comportamento organizacional é muito parecido quando pesquisado em organizações públicas ou privadas, ou seja, os processos administrativos básicos são bem parecidos, quer seja numa multinacional ou em um departamento de Estado num setor do governo (Denhardt, 2013).

Estas pesquisas sobre o comportamento dos indivíduos podem servir de subsídio para auxiliar na tomada de decisão dos gestores nas empresas, seja no meio corporativo privado ou público, sendo de relevância para fins estratégicos empresariais. Os investigadores estudavam os indivíduos e os grupos, nas organizações, com o objetivo de explicar as diferenças nos desempenhos individuais e em grupo.

Para Boreham et al. (2013), a organização do trabalho passou por inúmeras mudanças nas últimas décadas, as quais alteraram as formas de ser e agir dos indivíduos no ambiente laboral. As novas formas de organização do trabalho têm sido caracterizadas pela adoção de abordagens participativas na tomada de decisão, estruturação do trabalho em equipes com maior autonomia, substituição de qualificações específicas pela ampla formação dos trabalhadores, incluindo habilidades sociais, bem como o incentivo ao compartilhamento de conhecimentos entre os membros da organização.

Atualmente, a produtividade pode ser determinada pela tecnologia, pela organização do trabalho, com as variações que levam em consideração as capacidades cognitivas (não só emocionais e “espirituais”) dos indivíduos. Neste sentido, os atributos discricionários, para além do desempenho das tarefas estritamente obrigatórias, são agora alvo de diversos estudos, envolvendo tanto variáveis pessoais (traços de personalidade) como condições específicas, tais como atitudes, crenças e emoções (Borman et al., 2001; Konovsky; Pugh, 1994; Organ; Ryan, 1995; Ziegler et al., 2012).

O CCO poderá causar um enriquecimento nas relações humanas no trabalho, bem como nas relações entre as pessoas e as empresas, acarretando ganhos para ambos. Para tanto, pessoas e organizações devem tomar conhecimento e ampliar seu escopo de informação sobre tal assunto, através da divulgação e discussão do tema.

As interações entre os membros de uma organização configuram-se como elemento importante nos estudos sobre CCO, pois as interações entre os indivíduos e entre estes e a organização são influenciadas pelo contexto social (Chiaburu et al., 2013).

Diante desta realidade, este estudo apresentou a seguinte questão de pesquisa: em que medida as cinco dimensões de Organ (1988), definidas como altruísmo, desportivismo, cortesia, virtude cívica e conscienciosidade, são identificadas na Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) a partir da percepção de seus funcionários?

Neste sentido, a proposta desse trabalho tem como objetivo geral investigar, a partir do modelo de CCO de Organ (1988), as variáveis influenciadoras do CCO na CPRM, percebidos por seus empregados.

Para atingir este objetivo, foram determinados os seguintes objetivos específicos:

  1. Identificar a fundamentação teórica que englobe o CCO e a sua importância nas organizações;

  2. Levantar o estado da arte sobre os antecedentes e dimensões atitudinais do CCO relevantes para a análise do trabalho em questão;

  3. Aplicar questionário eletrônico como ferramenta para o estudo de caso;

  4. Mensurar a representatividade dos resultados obtidos; e

  5. Analisar os dados a partir da técnica estatística de regressão linear múltipla.

REVISÃO DE LITERATURA

Numa visão contemporânea, o conceito de cidadania passou a ser utilizado não apenas para especificar a relação que um indivíduo mantém com seu Estado-País, mas também para subsidiar teoricamente a compreensão sobre determinados comportamentos que são emitidos em ambientes específicos, tais como associações, grupos ou instituições de trabalho (Gomes et al., 2014).

Falconer (1999) defende que a cidadania organizacional pressupõe um continuum de práticas, desde a ação filantrópica até estratégias de sobrevivência da empresa em longo prazo. Ressalta-se ainda que existem formas de interação entre empresas privadas e as comunidades ou organizações sem fins lucrativos, como o patrocínio cultural de atividades promovidas por organizações do terceiro setor.

Conforme asseveram Sobral e Mansur (2013), o campo de estudos do comportamento organizacional foi reconhecido em meados dos anos 1960, o qual pode ser compreendido como uma área que examina o comportamento de ambientes organizacionais, assim como a influência que grupos de pessoas e indivíduos exercem sobre o comportamento nas organizações. Segundo Robbins et al. (2011), trata-se de uma área de investigação cujo objetivo é ajudar os administradores a explicar, prever e controlar o comportamento humano. Refere-se ao estudo sistemático das ações e atitudes das pessoas dentro das organizações.

O estudo do comportamento organizacional é fundamental para o desenvolvimento das empresas e pessoas, pois os objetivos organizacionais podem ser atingidos através da ajuda, comprometimento e colaboração. Foi deste campo que derivou a área do conhecimento sobre o CCO.

O termo CCO foi utilizado pela primeira vez por Bateman e Organ (1983) e Smith et al. (1983), num estudo que analisou a natureza e os preditores deste tipo de desempenho numa amostra de empregados e seus supervisores em dois bancos. Sob esta designação, os autores referiam-se àqueles comportamentos que os superiores apreciam, mas que não podem exigir dos seus subordinados.

De acordo com Costa et al. (2017), no cenário do universo corporativo atual, seja ele privado ou público, as organizações requerem, ainda mais, profissionais com os comportamentos de cidadania organizacional, ou seja, indivíduos com iniciativa, proativos e que não estejam restritos às rotinas e tarefas inerentes ao sistema formal da organização.

Organ (1988), por sua vez, os definiu o Comportamento de Cidadania Organizacional como sendo “comportamentos individuais discricionários, não direta ou explicitamente reconhecidos pelo sistema de recompensa formal, e que promovem o funcionamento eficaz da organização”. Para este autor, o conceito é composto pelas seguintes dimensões:

a) altruísmo: ações orientadas para ajudar uma pessoa com dificuldades no trabalho e comportamentos discricionários e, da parte dos trabalhadores, ajudar pessoas específicas em problemas relevantes na organização;

b) cortesia: ações que visam ajudar uma pessoa a evitar problemas no trabalho;

c) desportivismo: postura de cidadania que consiste em tolerar pequenas frustrações e inconveniências do trabalho sem reclamações;

d) conscienciosidade: padrão que resulta em ir além dos níveis mínimos exigidos de presença, pontualidade, manutenção do espaço e dos recursos no trabalho; e

e) virtude cívica: envolvimento responsável e construtivo na vida política da organização.

Os CCO têm sido considerados desejáveis nas organizações, sendo um tema pesquisado mundialmente e cuja definição consensualmente compartilhada por boa parte dos principais autores é a que os compreende como “ações informais dos trabalhadores que beneficiam a organização”.

Verchai e Laner (2008), com base em seu estudo que compreendeu a análise de 75 autores, cujas publicações foram apresentadas no Journal of Applied Psychology entre 1983 e 2008, definem CCO como “condutas não prescritas que beneficiam a organização como um todo, aumentando assim sua competitividade” e que transcendem a relação direito e deveres, podendo ser considerados como “um acordo informal entre as partes da organização”. Cabe ressaltar que Verchai e Laner (2008) incluem a competitividade em sua definição de CCO devido ao grande número de autores estudados que avaliaram empiricamente as consequências destes comportamentos nas organizações, no que diz respeito a este aspecto. O CCO, por sua definição, ocorre necessariamente fora da esfera formal e dos acordos previamente estabelecidos.

Estudo das dimensões dos comportamentos de cidadania organizacional

A literatura apresenta duas formas de se aplicar o termo dimensões na categorização de CCO. A primeira forma é entender dimensão como sendo o nível onde os comportamentos ou atos de cidadania ocorrem. A segunda forma é entender dimensão como componentes ou grupos de comportamento. Dentro dessa linha há várias dimensões, componentes ou grupos de comportamento que caracterizam o estudo do CCO.

A partir destas concepções teóricas, a noção de CCO foi abordada pelos estudos de Organ (1988) e seus colaboradores (Bateman; Organ, 1988).

Como afirmam Podsakoff et al. (2014) e Organ (1988), a cidadania organizacional é um comportamento individual, discricionário, não explicitamente reconhecido pelo sistema formal de recompensa e que contribui para o funcionamento eficaz da organização. Por discricionário, o autor explicita que o comportamento não é um requisito executável do papel ou da descrição do trabalho, e sim uma questão de escolha pessoal, de tal forma que a sua omissão não é geralmente entendida como passível de punição.

Podsakoff et al. (2000), com a intenção de contribuir para a construção de um quadro teórico mais consistente, realizaram um profundo estudo sobre as dimensões do CCO. Assim, mesmo existindo na literatura aproximadamente 30 diferentes formas de cidadania organizacional, os autores listaram sete dimensões principais, como ilustra o Quadro 1. Este quadro evidencia que as dimensões do CCO demonstram o proeminente conjunto de componentes e comportamentos associados ao tema.

Quadro 1. Dimensões dos Comportamentos de Cidadania Organizacional.

F

Fonte: Elaborado e adaptado pelos autores a partir de Podsakoff et al. (2000) e Marinova et al. (2010).

A partir dessas abordagens, Polat (2009) destaca alguns fatores que tendem a aumentar os níveis de exposição de comportamentos de cidadania organizacional, como: sentimentos agradáveis sobre o local de trabalho, o apoio, a igualdade, a satisfação no trabalho, a lealdade à organização, a confiança organizacional, a equidade na organização, a identidade organizacional, a percepção de salário satisfatório, o interesse pela organização, o sentimento de responsabilidade social e o aumento da motivação.

Antecedentes do comportamento de cidadania organizacional

Atualmente, as organizações podem ser caracterizadas como sistemas de interpretação do ambiente, sendo as suas construtoras, através de suas ações, com a finalidade de se obter vantagem competitiva, o aprimoramento constante e o desenvolvimento organizacional. Assim como os historiadores estudam o passado para melhor compreenderem o futuro, os líderes buscam descobrir os fatores que os antecedem, ou seja, os predecessores (preditores) dos CCO para entenderem melhor as suas origens.

Segundo Podsakoff et al. (2000) e Rego (2010), as pesquisas empíricas se concentram em quatro grandes categorias de antecedentes: individual (ou empregado), as características da tarefa, características organizacionais e comportamentos de liderança, conforme o Quadro 2 a seguir.

Quadro 2. Antecedentes do Comportamento de Cidadania Organizacional.

F

Fonte: Rego (2002).

MÉTODO

O presente trabalho apresenta uma abordagem qualitativa e quantitativa. Caracteriza-se como sendo, quanto aos meios, um estudo de caso. Quanto aos objetivos, é descritiva e aplicada, pois o resultado poderá ser usado como ferramenta de gestão organizacional para outras empresas públicas.

Empresa pesquisada

A CPRM é uma empresa pública com as atribuições de Serviço Geológico do Brasil (SGB), vinculada ao Ministério de Minas e Energia (MME), o qual estabelece as diretrizes básicas das políticas públicas do governo federal para as áreas de geologia, recursos minerais e energéticos. Como a empresa está geograficamente espalhada pelo Brasil, está distribuída nas 13 unidades regionais, são elas: Distrito Federal – DF (Sede), Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Fortaleza, Porto Alegre, Recife, Salvador, Belém, Manaus, Goiânia, Porto Velho e Teresina.

Como método de coleta de dados foi realizado um survey, cujo formulário foi aplicado online para verificar a influência de cinco preditores percebidos no ambiente de trabalho da CPRM (variáveis independentes): altruísmo, conscienciosidade, cortesia, desportivismo e virtude cívica, conforme o conceito de Organ (1988).

Após a aplicação dos 1.704 questionários, contemplando o universo total de funcionários da empresa, através do software Survey Monkey, o qual forneceu as 362 respostas em gráficos, as respostas foram extraídas conforme a escala Likert de cinco pontos preestabelecida: (1) discordo totalmente, (2) discordo, (3) não concordo e nem discordo, (4) concordo e (5) concordo totalmente.

Estas respostas foram todas tabuladas e codificadas de 1 a 5, formando um banco de dados numéricos, com o auxílio do software Windows Excel. Em seguida, foi empreendida a análise fatorial por média aritmética, que teve como objetivo agrupar as 31 assertivas: 30 delas foram agrupadas em cinco fatores, correspondentes às variáveis de Organ, e uma assertiva correspondeu ao eixo Y, considerada como pergunta. Após, foram feitos os testes estatísticos de regressão linear múltipla.

A empresa possui 1.704 funcionários e foi realizado um cálculo amostral para população finita (Equação 1), conforme Gil (2002), com a finalidade de identificar o número mínimo de questionários válidos a serem respondidos. Para chegar-se a este cálculo, foi utilizado o seguinte raciocínio:

Equação 1

F

Em que,

n : tamanho da amostra

Z² : nível de confiança escolhido

p : percentagem com a qual o fenômeno se verifica

q : percentagem complementar

N : tamanho da população

e² : erro máximo permitido

F

Considerando o tamanho total da população de 1.704 funcionários, para um erro máximo permitido de 5%, com um nível de confiança de 95% (sendo dois desvios) e, não sendo possível prever o valor para p, admite-se de forma conservadora 50%, pois se tem o maior tamanho da amostra. Diante de tais parâmetros estabelecidos, o tamanho da amostra (n) é igual a 313,6, ou seja, aproximadamente 314. Este número representa a quantidade mínima de questionários válidos respondidos para se realizar as análises estatísticas.

Foram distribuídos 1.704 questionários através do software eletrônico SurveyMonkey, via internet e por e-mail, com as assertivas para serem respondidas pelos funcionários, retornando 362 questionários devidamente respondidos e sendo esses possíveis de aproveitamento. Este software permite habilitar a opção de apenas aceitar o envio do questionário que esteja totalmente respondido. Isto faz com que o pesquisador não receba os questionários incompletos.

Os dados das 362 respostas foram superiores ao valor determinado pelo cálculo amostral (n = 313,6), sendo utilizados para compor a amostra deste estudo.

Desenho da pesquisa

A pesquisa foi desenhada conforme demonstra o modelo na figura 1.

Figura 1. Desenho da pesquisa

F

Para a análise dos dados, foi escolhida a regressão linear múltipla como forma de avaliar a relação entre as dimensões de CCO de Organ (1988) e a interpretação que os colaboradores da CPRM fazem do comportamento cidadão da empresa.

Segundo Abbad e Torres (2002), a regressão linear múltipla consiste em modelos multivariados de pesquisa, que envolvem análises do relacionamento entre múltiplas variáveis explicativas e, em alguns casos, múltiplas variáveis dependentes. Grande parte das pesquisas delineadas para examinar o efeito exercido por duas ou mais variáveis independentes sobre uma variável dependente utiliza a análise de regressão linear múltipla.

A regressão múltipla é definida por Tabachnick e Fidell (1996) como um conjunto de técnicas estatísticas que possibilita a avaliação do relacionamento de uma variável dependente com diversas variáveis independentes. Essa técnica é muito útil nas pesquisas da área de psicologia organizacional, já que estas, em sua maioria, envolvem variáveis independentes correlacionadas entre si.

Para Dunlap e Landis (1998), o uso de preditores redundantes, correlacionados entre si, é uma característica dos estudos da psicologia que, ao construírem medidas internamente consistentes, incluem múltiplas medidas correlacionadas ao mesmo construto, o que pode levar, em alguns casos, à exclusão de variáveis importantes na explicação da variável em foco. Nestes casos, é mais segura a utilização de técnicas estatísticas, como a regressão múltipla.

A utilização de ferramentas e instrumentos de medida cientificamente construídos, validados e testados por outros pesquisadores, pode permitir ao pesquisador o efetivo diagnóstico para a gestão do comportamento organizacional, assim como a possibilidade de futuras intervenções na realidade das organizações de trabalho.

A presente pesquisa utilizou dois estudos como base para a elaboração do questionário, contendo 31 assertivas. O primeiro foi o estudo de Porto e Tamayo (2003), no qual os autores criaram um instrumento de medição de civismo organizacional. Neste estudo foi aplicada a escala de civismo organizacional para 1.100 funcionários de diversas organizações do Distrito Federal. Os dados obtidos foram submetidos a análises fatoriais, utilizando-se o método Principal Axis Factoring (PAF) com rotação oblíqua. Os resultados indicaram cinco fatores com alfa de Cronbach superior a 0,80. A conclusão do estudo é que a validação dessa escala foi devidamente estabelecida e esta pode ser utilizada em pesquisas, mesmo para diagnóstico organizacional.

O segundo estudo que usamos como base foi a dissertação de mestrado de Martins (2014), defendida no Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa. Nele, a autora utilizou um questionário individual que foi distribuído para 820 trabalhadores civis da Força Aérea Portuguesa (FAP), tendo recebido como resposta 424 questionários válidos. Através da utilização de testes de hipóteses, o estudo identificou os antecedentes dos COO dos trabalhadores civis da FAP a partir dos estilos de liderança e personalidade proativa.

No presente estudo, foi elaborado um questionário estruturado com 31 assertivas, oito perguntas sobre o perfil socioeconômico e uma pergunta desfecho, direcionadas via correio eletrônico para todos os funcionários das 13 unidades regionais da empresa, utilizando a ferramenta eletrônica de pesquisa conhecida como SurveyMonkey (2018).

RESULTADOS

Com o auxílio do software Excel, foi realizada a análise de regressão linear múltipla para verificar se as cinco variáveis propostas apresentam significância estatistica e se a CPRM é considerada uma empresa cidadã, a luz de Organ (1988). A Tabela 1 apresenta estes resultados.

Tabela 1. Estatística de regressão, utilizando o Software Excel

F

Observa-se, a partir da Tabela 1, valores do coeficiente de determinação (R_Quadrado) próximos a 0,26, indicando que as cinco variáveis dependentes (altruísmo, conscienciosidade, cortesia, desportivismo e virtude cívica) representam ou explicam 26% da variável independente CCO. O coeficiente de determinação serve como instrumento didático para avaliar a utilidade de um modelo de regressão linear múltipla.

A Tabela 1 também contém a análise da variância da regressão e dos resíduos do modelo, utilizando o software Excel. Observa-se dois valores de F: próximos de 25 e de significação próximos de zero. Esses dados indicam que a variância da regressão e dos resíduos do modelo estão satisfatórios.

A mesma tabela apresenta a significância estatística dos coeficientes das variáveis do modelo (altruísmo, conscienciosidade, cortesia, desportivismo e virtude cívica), utilizando o software Excel. Estes coeficientes representam o grau de influência de cada uma das cinco variáveis propostas por Organ (1988) no CCO. Todos os cinco coeficientes apresentaram valores de p (valor p) próximos de zero, indicando que são relevantes estatisticamente para a variável dependente CCO. Além disso, entre as cinco variáveis, observa-se que virtude e desportivismo apresentam maiores coeficientes, 0,58 e 0,64, respectivamente. Dessa forma, são as que mais impactam no CCO.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nota-se que a investigação a respeito do CCO é marcada por complexidade em sua conceituação, o que reflete na dificuldade de delimitação teórica e, principalmente, de sua dimensionalidade.

A elaboração da presente pesquisa abordou a conceituação de CCO sob a delimitação inicial de Organ (1988), onde ficou restrito a apenas cinco variáveis que são: altruísmo, conscienciosidade, cortesia, desportivismo e virtude cívica. Este estudo permitiu analisar, avaliar e descrever alguns pontos importantes do CCO presentes na CPRM, e que foram percebidos pelos seus funcionários.

A partir da contextualização teórica e da pesquisa exploratória realizada na CPRM, buscou-se realizar um estudo de caso com o objetivo geral de investigar, sob os modelos de CCO de Organ(1988), as variáveis influenciadoras do CCO na CPRM e que são percebidos pelos funcionários.

Para satisfazer ao objetivo geral proposto, foi necessário atender a cada um dos objetivos específicos. O primeiro se propôs a identificar a fundamentação teórica que englobasse o CCO e a sua importância nas organizações. Para isto, foi realizado um levantamento em 35 artigos da base de busca científica Emerald Insights dos últimos três anos, da base da editora de revistas internacionais Elsevier e ainda de dissertações extraídas da base de dados da Capes do governo federal. O objetivo foi buscar estudos recentes relacionados ao CCO com ênfase nas cinco variáveis de Organ (1988), e não apenas nas definições lato sensu do CCO.

O segundo objetivo específico foi levantar o estado da arte sob a perspectiva dos antecedentes atitudinais e das dimensões do CCO relevantes para análise do trabalho em questão. O estudo desse levantamento se faz necessário, pois é partir deles que se podem inferir, utilizando-se das devidas ferramentas e técnicas estatísticas apropriadas, os CCOs futuros.

O terceiro objetivo foi medir a representatividade dos resultados obtidos a partir do auxílio do software Excel. Foi feita a conversão das informações extraídas do SurveyMonkey para o banco de dados em Excel, ou seja, as informações nominais foram transformadas numa base de dados numérica para poderem ser processadas no Excel.

E por fim, o último objetivo específico, foi analisar os dados a partir da técnica estatística de regressão linear múltipla com o uso do Excel. Os estudos de psicologia organizacional do trabalho já se mostraram eficientes e eficazes quanto ao uso de técnicas estatísticas, em especial, a regressão linear múltipla, onde há mais de uma variável independente a ser comparada.

Diante desses resultados, constata-se que todos os objetivos propostos foram atendidos, respondendo assim a questão central da pesquisa. Assim, o estudo sugere que sob a percepção dos funcionários da CPRM, essa empresa é considerada cidadã e que conforme a análise dos dados estatísticos, as variáveis independentes “virtude” e “desportivismo”, exercem forte influência nessa constatação.

Como fator de limitação da pesquisa, o estudo foi feito através de pesquisa quantitativa e qualitativa, em que foi elaborado um questionário adaptado de outros modelos, além da questão comportamental que sugere um viés subjetivo.

Espera-se novos estudos e pesquisas no âmbito das empresas públicas do governo federal, pois só assim seria possível haver comparações entre este estudo e os novos estudos realizados.

Para pesquisas futuras, sugere-se a análise de itens para verificar a confiabilidade do instrumento a partir da correlação item-total, correlação entre os itens, alfa de Cronbach e ômega de Mcdonald. Além disso, a análise de estrutura interna da escala para verificar quais são as dimensões latentes que possam explicar a variabilidade das respostas oferecidas em cada item, análises iniciais visando confirmação da estrutura interna e Análises latentes para verificar o efeito de variáveis exógenas na variabilidade dos dados, a partir de modelagem de equações estruturais.


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Recebido: 29 mar. 2019

Aprovado: 02 abr. 2019

DOI: 10.20985/1980-5160.2019.v14n3.1594

Como citar: Gouvea, F. S.; Brandão, M. R. M.; Vianello, J. M. (2019), “Comportamento de cidadania organizacional: um estudo de regressão linear múltipla na Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM)”, Sistemas & Gestão, Vol. 14, No. 3, disponível em: http://www.revistasg.uff.br/index.php/sg/article/view/1594 (acesso dia mês abreviado. ano).