A importância da gestão do catálogo de materiais para o processo de suprimento – um estudo de caso

Simone Zagatto de Lourenço

Instituto de Tecnologia em Fármacos/Farmanguinhos, Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.

simonedelourenco@gmail.com

Denilson Sant Ana Bastos

Instituto de Tecnologia em Fármacos/Farmanguinhos, Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.

denilsonbastos22@gmail.com

Cristina Conceição Rocha Guedes

Instituto de Tecnologia em Fármacos/Farmanguinhos, Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.

cristinaguedes4@gmail.com

Fernando Medina

Instituto de Tecnologia em Fármacos/Farmanguinhos, Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.

fernando.medina@far.fiocruz.br


RESUMO

A correta gestão de um catálogo de materiais é importante para o processo de suprimento numa empresa. Sem a atenção necessária desta atividade, problemas poderão acontecer na aquisição, controle e consumo dos materiais e produtos com impactos nos níveis de serviço e na competitividade. Através de um estudo de caso, este trabalho aborda a estratégia utilizada por uma empresa para implementar um sistema integrado de gestão empresarial e da gestão do seu catálogo de materiais que é a base da estratégia. Trata-se de um laboratório farmacêutico oficial do governo federal que atua no segmento da saúde através da produção e distribuição de medicamentos para todo o País. O estudo relata os motivos que levaram o laboratório a trocar o seu sistema informatizado por um sistema gerencial de Planejamento dos Recursos da Empresa (Enterprise Resource Planning - ERP), evidenciando as ações realizadas na gestão do catálogo com destaque na mudança da forma de utilização do catálogo para uma estratégia de gestão centralizada, na tratativa das informações para realizar um cadastro e no alinhamento dos novos processos com os setores envolvidos. O estudo destaca como se deu a montagem da equipe para gerenciar o catálogo de materiais e apresenta as dificuldades encontradas, soluções adotadas e resultados alcançados. Este trabalho se deu através de um estudo de caso e de uma revisão bibliográfica para identificar os conceitos atuais sobre o tema, tendo um corte temporal que compreende os anos de 2015 a 2017.

Palavras-chave: Empresarial; Logística; Gestão; Catalogação; Compras.


INTRODUÇÃO

Na busca pela excelência em diversas áreas, o Laboratório Oficial, objeto deste estudo, percebeu a necessidade de implantar um sistema integrado de gestão. Entre os motivos que justificam a implantação de um sistema desse porte, estão a necessidade de maior controle e confiabilidade dos dados, otimização dos processos internos, monitoramento das informações em tempo real, revisão e integração dos processos e redução de retrabalho.

Com a necessidade de a empresa se preparar para a implementação do sistema de gestão empresarial – ERP, foi necessário realizar um planejamento para a chegada desse momento, no qual foram iniciadas diversas ações visando adequar os processos internos de negócio, entre elas o catálogo de materiais da empresa que precisou ser adequado ao modelo de cadastro proposto pelo novo ERP. O novo sistema possui uma lógica de cadastro diferente da utilizada no sistema anterior e essa característica força uma mudança na forma de cadastrar um material novo e na forma de gerir o catálogo.

Durante a elaboração do estudo, identificaram-se duas experiências que deram soluções para problemas com catálogos de materiais: uma de 2010 do governo do estado da Bahia, que precisou adequar e modernizar seu catálogo de materiais por meio da padronização das descrições de materiais (PDM), conforme relatado por Gomes (2010); outra, iniciada em 2011, pela empresa Logum Logística SA, que precisou centralizar os cadastros de materiais para melhorar o controle e a eficácia do seu catálogo, visando dar respostas aos problemas enfrentados com o crescimento dos negócios da empresa (Portal ERP, 2014).

Este estudo se desenvolveu mediante a análise de um referencial teórico, utilizado para expor os conceitos sobre o tema tratado, segundo os principais autores. Em seguida, detalha a metodologia utilizada para o seu desenvolvimento; fala do laboratório estudado e sua importância estratégica no cenário brasileiro da saúde pública, o seu sistema informatizado anterior e a forma como era tratado o catálogo de materiais. Ademais, apresenta o novo sistema, enfatizando o módulo de management materials (MM), em que está inserido o cadastro de materiais; relata o modelo proposto para a gestão do catálogo de materiais; aborda como se deu o processo de migração do catálogo de materiais do sistema anterior para o novo, como foi o processo pós-implementação e as análises dos problemas encontrados; e discorre acerca das ações mitigadoras realizadas para resolver tais problemas. Por fim, conclui relatando os resultados e ressaltando a importância da gestão de um catálogo de materiais e como ela contribui com o ciclo de vida dos materiais e produtos, com a cadeia produtiva e com o processo de suprimento dentro da empresa.

A problemática estudada é a ausência de gestão do catálogo de materiais, situação que impossibilitava a continuidade da implementação do sistema adquirido pelo laboratório estudado em função da quantidade de dados que não existiam no sistema anterior, comprometendo o cronograma de início do funcionamento do sistema adquirido. Para se ter uma idéia do problema, o catálogo anterior tinha mais de 26.000 itens, sendo que apenas 6.820 foram movimentados nos últimos quatro anos, situação que causava transtornos para os usuários, para a administração de materiais e para o setor de comprar, entre outros. Na solução do problema, a equipe de gestores do Departamento de Logística propôs um modelo de gestão de catálogo baseado nos conceitos de classificação e catalogação de materiais que permitisse a implementação do novo sistema e o monitoramento após o início da sua utilização.

Neste sentido, os objetivos gerais deste estudo são: relatar a experiência vivida pelos gestores do Departamento de Logística do laboratório pesquisado durante a adequação do catálogo de materiais para implementação de um novo sistema gerencial; e demonstrar a importância da gestão de um catálogo de materiais para a gestão de uma empresa. De forma específica, o estudo objetiva: descrever o modelo anterior da gestão de catálogo de materiais; demonstrar o sistema gerencial do modelo anterior; relatar as especificidades do catálogo do novo sistema; evidenciar as estratégias de preparação e migração dos dados de um sistema para o outro; analisar o processo de implementação do catálogo no sistema novo; discutir os problemas identificados após a implementação do sistema novo; e mostrar que as mudanças realizadas evitaram problemas contábeis e fiscais na administração de materiais.

REFERENCIAL TEÓRICO

O catálogo de materiais e a gestão da cadeia de suprimentos

Quando se fala de cadeia de suprimentos deve-se pensar na integração de todos os atores envolvidos no ciclo de vida de um produto (bens e serviços). Para atender às demandas de seus clientes, a empresa precisar fazer várias interações dentro e fora dela, inclusive com o próprio cliente. Ela precisa pensar na interação com seus fornecedores, com fornecedores dos fornecedores e até com os clientes dos clientes. A essa gama de interações, visando atender às expectativas do usuário final no tempo certo e na forma desejada, dá-se o nome de cadeia de suprimentos. Neste sentido, um catálogo de materiais tem fundamental importância na cadeia de suprimentos, pois ele precisa atender às necessidades de vários atores envolvidos no processo de suprimento e fornecimento de materiais, uma vez que ele contém informações que impactam no mercado fornecedor, no cliente, nos usuários internos, nos fornecedores dos fornecedores e nos clientes dos clientes. Nesse sentido, questões como a descrição dos materiais e as unidades de medidas precisam ter especial atenção, pois elas têm grande impacto no ciclo de vida dos materiais e produtos dentro e fora da empresa. De acordo com Bastos (2015), as atividades logísticas e da cadeia de suprimentos precisam estar alinhadas para que as necessidades dos clientes sejam atendidas de forma eficaz. Este conceito precisa ser entendido pela ótica da necessidade de todos que utilizarão os materiais, sendo o cadastro o momento no qual essas questões precisam ser consideradas para não haver prejuízos a qualquer parte da cadeia de suprimentos.

Segundo Bowersox et Closs (2010), as funções logísticas são combinadas em três áreas operacionais: distribuição física, apoio à manufatura e suprimento. Esse conceito reforça a importância do catálogo de materiais dentro das atividades logísticas na cadeia de suprimentos, pois é impensável falar em integração sem que as condições para isso estejam delineadas na fase inicial do ciclo de vida do material, que é o seu cadastro no catálogo que será utilizado por várias áreas da empresa. De acordo com Gomes (2010), um catálogo de materiais problemático, e que não garante a qualidade da compra, nasce e se desenvolve pela falta de padrões que obriguem o registro dos atributos imprescindíveis para a caracterização de cada tipo de material. Em contraposição a esse cenário, um catálogo padronizado pode garantir maior qualidade, agilidade e precisão no processo de suprimento de materiais, resultando em eficiência e eficácia.

Logística empresarial e a gestão nas empresas públicas

As atividades da administração pública que estão inseridas em alguma cadeia de produção costumam apresentar dificuldades em função da forma como os fluxos e serviços estão organizados e em função da forma como a sua logística opera na execução dessas atividades. Em geral, os entraves burocráticos muito comuns na esfera pública trazem algum tipo de obstáculo para a realização destas atividades na administração estatal, como, por exemplo, o tempo excessivo na aquisição de materiais em função de fluxos e processos mal estruturados, dificuldade em cumprir prazos de entrega em função de contratos deficientes, dificuldade em manter níveis adequados de estoques para atender às áreas produtivas e níveis de serviços insatisfatórios. Algumas empresas do setor público atuam em atividades similares às empresas do setor privado, como é o caso dos laboratórios oficiais que, assim como os laboratórios privados, produzem e distribuem medicamentos para seus clientes; e, apesar de pertencerem à administração pública, seus processos internos são iguais aos de qualquer empresa deste segmento e precisam que a gestão da sua logística interna e a sua participação na cadeia de suprimento funcionem da forma mais moderna possível. Conforme Ortolani (2001), é inevitável que as organizações públicas utilizem as mesmas práticas avançadas de logística aplicadas atualmente às empresas privadas, pois somente assim será possível reduzir custos, otimizar sistemas e aumentar a eficiência e eficácia em operações logísticas na gestão pública.

Para as empresas atenderem às necessidades dos clientes e manterem-se competitivas, é necessário que tenham níveis de serviços satisfatórios e produzam bens e serviços ao menor custo sem comprometer a qualidade desejada. É por meio dos seus processos logísticos que elas buscam melhorar a rentabilidade nas ofertas dos bens e serviços produzidos distribuindo-os aos clientes. A logística empresarial estuda a forma como a administração das empresas pode fazer isso.

De acordo com Ballou (1993), a logística empresarial associa o estudo e a administração de fluxos de bens e serviços e da informação associada que os põe em movimento. Ademais, trata das atividades de distribuição física, administração de materiais, transporte, armazenagem, controle de estoques, processamento de pedidos, movimentação interna, planejamento logístico e nível de serviço. Esse conceito tem sido muito empregado nas empresas privadas e, apesar de algumas iniciativas recentes, essa prática ainda não é comum no segmento no público. Com a crescente cobrança dos órgãos de controle e da sociedade por melhores práticas de gestão e de utilização dos recursos públicos, algumas empresas públicas já têm procurado gerenciar seus processos com base nos conceitos de logística empresarial, fortalecendo o entendimento de que o controle e a melhora dos seus processos são o caminho para alcançar esses objetivos. Neste sentido, a logística empresarial tem contribuído com esse entendimento, pois os diversos setores que atuam no atendimento dos requisitos dos clientes para a produção dos bens e serviços precisam ter forte interação entre seus processos internos, mantendo altos os níveis de serviços. Essas atividades têm impactos na produção dos bens e serviços, uma vez que elas são importantes para a formação do preço dos produtos. É durante a realização dessas atividades que se evitam os desperdícios que podem elevar os custos. De acordo com Bowersox et Closs (2010), a gestão logística preocupa-se com o movimento e com a estocagem de materiais e de produtos. Esses autores ressaltam, ainda, que as operações logísticas começam com o embarque inicial do material de um fornecedor e termina quando um produto acabado é entregue ao cliente. Neste contexto, todas as fases desse ciclo precisam ser monitoradas para que não haja impactos no preço e na qualidade. A correta gestão de um catálogo de materiais contribui fortemente com esses conceitos.

Laboratórios farmacêuticos oficiais

Os laboratórios oficiais têm sido um recurso importante do governo para promover a assistência farmacêutica aos que precisam, incluindo aí a parcela da população que depende exclusivamente dos serviços públicos e aquela que tem condições de utilizar os serviços privados, mas utilizam o público quando se trata de programas de saúde pública, como as campanhas de vacinação e o programa de tratamento de doenças sexualmente transmissíveis (DST/AIDS), por exemplo, pois são esses laboratórios que atendem os programas do Ministério da Saúde. Além dessa visão assistencial, os laboratórios oficiais também desempenham um importante papel no desenvolvimento da economia, mediante parcerias com laboratórios privados nacionais e internacionais para transferência de tecnologia na produção de medicamentos que também são distribuídos à população que precisa de acesso a eles (Gadelha et al., 2012).

Outro importante papel dos laboratórios oficiais no cenário nacional é o de formulação de políticas e fomento à produção pública de medicamentos. De acordo com Magalhães (2011), esses laboratórios agem não somente na manufatura, mas são estratégicos como indutores de políticas, desenvolvimento de formulações e novos fármacos e, ainda, como regulador de preços no mercado nacional. Esses laboratórios pertencem à administração pública e precisam seguir legislações específicas sobre compras e contratações de serviços. Apesar de serem instituições públicas, é necessário que seus processos internos sejam ágeis e estejam alinhados aos conceitos de gestão empresarial para que as interações com o mercado não resultem em demoras nos suprimentos necessários para o funcionamento da sua cadeia de produção.

Compras governamentais

Enquanto a administração pública burocrática se concentra no processo legalmente definido para definir procedimentos para contratação de pessoal, compra de bens e serviços, e em satisfazer as demandas dos cidadãos; a administração pública gerencial orienta-se para os resultados. A burocracia estatal se concentra nos processos sem considerar a alta ineficiência que isso envolve. É assim porque acredita-se que este seja o modo mais seguro de se evitar os problemas mais comuns na gestão pública como a corrupção, e de que é muito mais difícil punir os desvios depois de praticados, preferindo-se, então, estabelecer controles prévios. A falta de objetivos claros também impõe a necessidade de controlar os procedimentos através da burocracia (Bresser-Pereira, 1998).

Na última década, este cenário se modificou com diversas ações de melhorias na gestão pública buscando torná-la mais eficiente. Iniciativas de alguns órgãos públicos, e até mesmo algumas isoladas de gestores públicos, visam otimizar seus processos internos. Essas ações têm contribuído para deixar as organizações mais ágeis nas suas gestões, sem perder a essência da sua atividade-fim que é servir ao público. A modernização da administração pública é importante principalmente no que diz respeito ao processo de suprimento dos materiais e insumos necessários para o funcionamento de organizações que dependem deste abastecimento para cumprirem sua missão institucional. Este processo causa outro fenômeno: tornar a administração pública um grande consumidor, com grande impacto na economia, por meio do volume de recursos que as compras públicas injetam através do comércio.

O artigo 57 da Constituição Federal Brasileira determina a obrigatoriedade de que todas as compras e contratações de serviço na esfera pública sejam realizadas por meio de processo licitatório para assegurar a igualdade de condições na participação de todos os licitantes. Em relação às contratações, a Lei nº 8.666/93 estabelece as regras a serem seguidas nos procedimentos com a administração pública. Em seu artigo 15, a Lei prevê que as compras públicas, sempre que possível, deverão: 1) atender ao princípio da padronização que imponha compatibilidade de especificações técnicas e de desempenho; 2) submeter-se às condições de aquisição e pagamento semelhantes às do setor privado; 3) ser subdivididas em tantas parcelas quantas necessárias para aproveitar as peculiaridades do mercado, visando atender ao princípio da economicidade; e, 4) balizar-se pelos preços praticados no mercado no âmbito dos órgãos e entidades da Administração Pública. Neste sentido, é de extrema importância que os órgãos da administração pública criem as condições necessárias para o cumprimento do estabelecido na legislação, a partir de processos e procedimentos internos que permitam a melhor compra para a administração. Mais uma vez, fica evidente a relevância de uma perfeita gestão do catálogo de materiais nas empresas públicas para que suas estratégias sejam viáveis.

Catalogação de materiais

A importância de catalogar materiais se dá em função da necessidade de controlar o ciclo de vida do material ou produto, desde a necessidade da compra até a sua entrega ao cliente, passando pela pesquisa de mercado, aquisição, recebimento, armazenagem, movimentação física, produção, contabilização, até a expedição. A necessidade de atender às exigências de um processo integrado na gestão das empresas também é outro fator importante para a catalogação dos materiais e produtos, pois os diversos setores pelos quais os materiais serão usados têm necessidades diferentes e estas precisam estar contempladas nas suas características para que não haja gargalos na cadeia produtiva ou de distribuição da empresa. Neste sentido, torna-se de extrema importância gerenciar adequadamente a catalogação dos materiais, acompanhando todas as alterações que se fizerem necessárias depois da aquisição. De acordo com Mattos et al. (2017), devido à diversidade de materiais que são gerenciados pelas organizações, surgiu a necessidade de classificá-los, para permitir um melhor planejamento e controle, além de auxiliar no processo de compra. Um bom sistema de Codificação e Classificação de Materiais é fundamental para a eficiência operacional e contábil. Conforme Severino Filho (2006), gestão de materiais é um conjunto ambiental constituído por todos os órgãos da empresa, interagindo entre si, proporcionando condições necessárias a uma atuação integrada e eficiente, com o objetivo de atender convenientemente às necessidades operacionais. Segundo Barbieri et Machline (2009), a catalogação é voltada para uma fase do processo em que cada material deverá ser identificado e ordenado logicamente, a fim de atender às necessidades operacionais e facilitar a sua leitura, seja para o processo de distribuição ou de requerimento, ao setor de compras ou fornecedores, e também atingir a clareza necessária ao solicitante para o atendimento do usuário final. Gerenciar um catálogo de materiais requer investimento da empresa nesta atividade que pode ter impactos no custo de produção e na competitividade, uma vez que o correto cadastro e uma catalogação criteriosa permitem o uso e a movimentação dos materiais de forma a evitar perdas com falhas durante os processos internos.

Para Gomes (2016), padronizar é um meio de assegurar qualidade e, normalmente, resulta em redução de custos. A padronização das descrições dos materiais conduz à redução da variedade de materiais utilizados na administração pública e, por consequência, resulta em simplificação do controle dos estoques, em diminuição do espaço dos almoxarifados e em diminuição dos custos de estocagem, tais como o custo do armazenamento físico, do manuseio e da distribuição e da obsolescência. Ainda de acordo com o autor, outro fator da padronização é o mercado, isto é, deve-se dar preferência a materiais que sejam facilmente encontrados no mercado fornecedor sem, entretanto, ferir a vedação legal de direcionamento para marcas, de itens sem similaridade ou com características e especificações exclusivas. Em síntese, sem critérios de padronização bem definidos, é impraticável obter-se uma boa catalogação dos materiais. Considerando a quantidade de ações e controles para realizar uma catalogação, é importante que as empresas invistam em recursos materiais e humanos com mão de obra qualificada na realização desta atividade, pois a catalogação tem papel fundamental nas compras e na gestão de estoque, entre outras atividades da administração de materiais.

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo de caso, realizado no período de 2015 a 2017, sobre as mudanças realizadas na gestão do catálogo de materiais para evidenciar o impacto desta atividade na gestão do laboratório em análise e no seu sistema integrado de gestão. A pesquisa foi realizada pelos próprios gestores do Departamento de Logística do laboratório, que atuaram nas mudanças que são objeto deste estudo.

Em 2015, foram analisados os mapeamentos das atividades do modelo anterior, a modelagem da estratégia proposta e uma planilha de Excel criada com as informações necessárias ao novo sistema. As análises se deram por meio de consultas aos arquivos do Departamento de Logística e do Escritório de Processos do laboratório. Além disso, foram analisadas as informações sobre as trocas de mensagens entre a equipe de gestão de catálogo e os usuários finais, para identificar os problemas iniciais relatados num canal de comunicação específico (e-mail corporativo) referentes ao ano de 2016. De posse das informações e conhecida a situação problema, realizou-se uma análise do modelo proposto para identificar a sua eficácia. Sendo assim, também foram avaliados os indicadores do setor de gestão do catálogo dos anos de 2016 e 2017, período em que o modelo proposto já estava implementado. Juntamente ao estudo de caso, realizou-se uma revisão bibliográfica para identificar o que preconiza a literatura acerca do tema estudado e montar um referencial teórico para fundamentação da pesquisa. Todos os dados colhidos foram analisados sob a ótica qualitativa, baseada no conhecimento teórico e experiência profissional dos pesquisadores que atuam na área de logística empresarial, gestão de cadeia de suprimentos e gestão de processos.

Cenário do estudo

O estudo teve como cenário um laboratório farmacêutico oficial, com um papel estratégico na promoção da saúde por meio da produção de medicamentos, pesquisa, desenvolvimento tecnológico e geração e difusão de conhecimento. Além disso, tem forte atuação no complexo econômico e industrial da saúde (CEIS), dada a sua prática no subsistema de base química e biotecnológica e na estratégia de desenvolvimento da economia nacional, realizando parcerias com o setor privado para o desenvolvimento de novos produtos e transferência de tecnologia para nacionalização do conhecimento na área de química fina e produção de insumos farmacêuticos ativos (IFA).

O laboratório é uma organização pública da administração indireta, que ocupa, atualmente, posição estratégica como laboratório oficial vinculado ao Ministério da Saúde, com capacidade instalada de produção de mais de 6,5 bilhões de unidades de medicamentos. É responsável pela geração de 13% da receita bruta global da instituição a que pertence e representa 9% da força de trabalho desta instituição.

Dentre os medicamentos que fabrica estão os antibióticos, anti-inflamatórios, anti-infecciosos, antiulcerosos, analgésicos, medicamentos para doenças endêmicas, como malária e tuberculose, antirretrovirais para tratamento da Aids e hepatites virais, medicamentos para o sistema cardiovascular e o sistema nervoso central. Além da produção destes itens, o laboratório também é responsável por fazer a distribuição destes medicamentos para todas as secretarias municipais de saúde dos mais de cinco mil municípios brasileiros.

DETALHAMENTO DO ESTUDO DE CASO

O sistema anterior e a gestão do catálogo de materiais

Por ser um laboratório farmacêutico, existe a necessidade de seguir as boas práticas de fabricação exigidas pela legislação sanitária. Por este motivo, há alguns anos, criou um sistema informatizado para controlar as ações relativas à produção de medicamento. Trata-se de um sistema interno desenvolvido por equipe própria com a principal finalidade de atender à área de produção. Porém, não contemplava todas as áreas e atividades e, com o passar do tempo, a equipe de desenvolvedores da área de tecnologia da informação (TI) teve de fazer ampliações para, além das demandas da área de produção, atender às necessidades de outras áreas. A principal deficiência deste sistema, que impediu que ele alcançasse esse objetivo, foi a priorização da lógica produtiva sem considerar uma lógica contábil e comercial que uma empresa desse porte precisa. Diante disso, houve dificuldade na utilização dele pelas demais áreas da empresa que apoiavam as atividades de produção, entre elas, a área de logística, a área contábil e a área comercial. Com este cenário, o controle de algumas atividades dependia de procedimentos operacionais ou ficavam sob os critérios de cada usuário, como foi o caso da atividade de cadastro de materiais. No modelo anterior, o recurso do sistema que realizava o cadastro de materiais era muito simplista e com apenas duas informações – descrição e unidade de medida – era possível cadastrar um item. Isso era possível porque o sistema anterior não era integrado nem foi desenvolvido com uma lógica contábil e comercial, sua principal concepção era atender à área de produção, sem considerar a integração deste processo com os demais processos da empresa.

O cadastro de materiais do sistema anterior

No modelo anterior, o processo de cadastro de materiais era descentralizado, os próprios usuários acessavam o sistema e efetuavam o cadastro e as informações obrigatórias do sistema para realizar um cadastro eram apenas a descrição e a unidade de medida. Esse processo de cadastro se mostrou pouco eficiente: antes do cadastro de um item, os usuários não executavam uma busca para verificar se ele já estava cadastrado e isso gerou uma quantidade de cadastros duplicados, triplicados e até multiplicados. Essa multiplicidade dos cadastros se deu também por causa da limitação do sistema, que não possuía um campo para identificação de quem solicitou a compra do material, ou seja, após o recebimento do material, qualquer outro solicitante podia requisitá-lo ao almoxarifado. Apesar da compra ter sido originada através de um planejamento para um projeto ou atividade específicos de um solicitante ou setor, o item poderia ser retirado por qualquer outro solicitante.

O resultado desta forma de gerenciar foi um catálogo de materiais inchado, com mais de vinte mil itens em desuso, situação que impactava negativamente o processo de suprimentos, uma vez que boa parte dos itens do cadastro não era compatível em características com o que o mercado oferecia.

Saneamento do catálogo no modelo anterior

Em 2014, o Departamento de Logística assumiu a responsabilidade de reestruturar alguns processos de aquisição de materiais da unidade. Entre as ações para viabilizar a reestruturação desses processos estava a criação de um setor que, dentre outras atividades, tinha a responsabilidade de sanear o catálogo de materiais, cadastrar novos itens e centralizar o cadastro de materiais. As premissas definidas para sanear o catálogo de materiais foram:

Após a centralização, os acessos para cadastro de novos materiais foram retirados dos solicitantes, a pedido do Departamento de Logística, para que estes não pudessem mais cadastrar itens no sistema. Esta atitude, apesar de impopular, foi necessária para que o catálogo pudesse gerar informações confiáveis para as demais áreas da empresa, sendo, portanto, uma estratégia necessária naquele momento.

Com o início da atividade de saneamento do catálogo de materiais pelo novo setor, foi possível uma redução dos itens. Estudo de Bastos (2015) mostra uma redução de mais de 26 mil itens cadastrados para pouco menos de sete mil movimentados nos últimos quatro anos que precederam ao estudo. Na tabela 1, pode-se comparar a quantidade de itens cadastrados com a quantidade de movimentações feitas por tipo de material no catálogo de materiais do laboratório.

Tabela 1. Quantidade de itens do catálogo de materiais X quantidade de itens movimentados no catálogo de materiais do laboratório estudado

Figura1

Fonte: Elaborado a partir de Bastos (2015, p. 102)

Destaca-se que os dados apresentados na tabela 1, coluna ‘Quantidade movimentada nos últimos 4 anos’, refletem o cenário após a exclusão dos cadastros repetidos, evidenciando o impacto da forma de gerenciar o catálogo do sistema anterior. Trata-se de um levantamento dos dados do laboratório referente ao período dentro do corte temporal deste estudo.

Com as estratégias e ações de mudança definidas e validadas, partiu-se para a implementação propriamente dita do modelo proposto. Neste momento, foram realizadas as ações para migração dos dados, contemplando todo o trabalho de saneamento realizado no catálogo de materiais para que o novo sistema começasse baseado nos conceitos pré-estabelecidos para uma gestão moderna do catálogo.

Novo sistema

Entre os objetivos do ERP está o de integrar todos os dados e processos de uma empresa. O Sistema Integrado de Gestão Empresarial, outro conceito para ERP, adquirido pelo laboratório foi o SAP ERP. Criado por uma empresa alemã de mesmo nome, o sistema é dividido em módulos, os quais contêm as funcionalidades voltadas para todas as áreas de negócio da empresa. Esses módulos atendem às áreas de produção, compras, vendas, distribuição, armazenagem e recursos humanos, entre outros. Os que foram implantados até a data deste estudo são:

O cadastro dos materiais e a gestão do catálogo são realizados dentro do módulo MM. Este módulo se integra a todos os outros do sistema e dá suporte às fases de planejamento das necessidades de consumo, planejamento e gestão de compras, recebimento de materiais, venda de produtos, entre outros.

O alinhamento entre os sistemas

O novo sistema utiliza uma característica chamada “tipos de materiais” para definir a forma como serão comprados, recebidos, armazenados, contabilizados, entregues ao solicitante e expedidos. Esses tipos têm suas siglas em alemão o que dificulta o entendimento e cria certa rejeição por parte dos colaboradores. Para facilitar a comunicação interna, sugeriu-se modificar suas siglas originais para um modelo que permitisse melhor entendimento dos usuários.

Durante o planejamento para a entrada do novo sistema em produção, foi necessário identificar por tipo de material quais campos seriam de preenchimento obrigatório (o sistema não permite a conclusão do cadastro se não for preenchido) e quais são de preenchimento facultativo, embora relevante (se o campo não for preenchido trará algum problema, mas o sistema aceita a realização do cadastro). Para cada tipo de material foi dada uma sigla mais próxima da realidade do laboratório. A figura 1 apresenta a relação entre a nomenclatura original dos tipos de material e a nomenclatura criada para cada tipo de material já utilizado, com a sua descrição detalhada.

Figura 1. Tipo de material original X tipo de material do laboratório

Figura2

Fonte: Os próprios autores (2016)

A nomenclatura utilizada pelo sistema anterior para separar os tipos de materiais e seus grupos de mercadorias era “grupos e sub-grupos”, a definição validada para essa segregação está demonstrada na figura 2, que apresenta a relação entre o tipo de material do novo sistema, sua denominação, seu intervalo de registro – também chamado de range de numeração – e quais os grupos e subgrupos do sistema anterior estão relacionados a eles.

Figura 2. Tipo de material SAP x range de numeração x sistema anterior

Figura3

Fonte: Os próprios autores (2016).

Essa estratégia foi necessária para adequar os dados no sistema anterior, que eram mínimos, ao modelo do novo sistema em função da disparidade entre os dois modelos, visto que o primeiro era uma solução interna para atender a uma demanda específica; enquanto o segundo trata-se de um sistema universal com uma lógica totalmente diferente e com uma infinidade de campos e dados a serem preenchidos para garantir a sua característica de sistema integrado de gestão.

Características e peculiaridades do novo sistema

O novo sistema trouxe algumas características comuns ao seu perfil de sistema integrado e é este perfil que obriga o laboratório a ter todos os seus processos revisados para que atuem sob a ótica da integração e, assim, permitir a implementação. Três dessas características são: grupo de mercadorias, unidade de medidas e classe de avaliação.

O grupo de mercadorias é um campo obrigatório que segrega dentro do tipo de material um grupo específico. Por exemplo: dentro do tipo de ‘material de consumo’ (ZCON), possuímos o grupo de mercadorias ‘material laboratorial’. Neste grupo, estão os materiais utilizados nas pesquisas, assim como existem outros grupos ligados a outras áreas importantes, como a de produção. Este campo é importante porque segrega os materiais dentro de um tipo de material específico e se não for utilizado corretamente trará problemas para a utilização do material depois que ele der entrada no estoque.

A unidade de medida é a parte do catálogo de materiais que requer maior atenção. Ela tem relação direta com a forma como o mercado fornece o material e sua utilização dentro da empresa. Um olhar especial sobre essa parte é necessário para evitar problemas na utilização do material em todas as fases do seu consumo.

Para um cadastro de qualidade, é imprescindível uma interação com as demais áreas que detém informações importantes sobre o material. Neste sentido, a partir de uma relação fornecida pelo setor de qualidade, as unidades de medida do novo sistema foram padronizadas de acordo com o estabelecido pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO) e, a contar deste momento, não se permitiu mais criar novas unidades de medida sem o consentimento das áreas centralizadoras, com o objetivo de preservar a padronização estabelecida.

O novo sistema traz três campos de unidade de medida, quais sejam: “unidade de medida básica”, que se refere à unidade de administração de estoque; “unidade de medida de vendas”, campo utilizado nas notas fiscais de saída; e “unidade de medida de compras”, que é utilizado nos pedidos de compras. Desses campos, apenas o primeiro citado é obrigatório; os outros só devem ser preenchidos se a unidade de medida for diferente da unidade de medida básica. Tendo em vista esses casos, foi necessário cadastrar uma tabela de conversão para que o sistema entenda qual quantidade de uma unidade de medida equivale à outra. Este aspecto requer muita atenção, pois esta conversão ocorre sempre com a unidade de medida básica do material, não sendo possível incluir duas unidades de medidas diferentes.

O campo unidade de medida do novo sistema tem uma sigla com três caracteres e para atender a esta exigência foram criadas “máscaras” para as descrições das unidades de medida utilizadas. Essa foi mais uma adequação necessária, porque o sistema anterior não tinha esta característica, e a partir daí essa regra teria que ser utilizada. A figura 3 apresenta uma tela do novo sistema, com alguns exemplos de unidade de medida e suas descrições originais que necessitaram de adequação.

Figura 3. Unidades de medidas e suas descrições

Figura4

Fonte: Tela do novo sistema (2016)

Os campos de unidade de medida precisam ser rotineiramente controlados e, às vezes, adequados, pois eles têm forte interação com os processos internos, como a administração de estoques, consumo, manufatura, fornecimento e movimentação física, e os processos externos, como compras e pagamento ao fornecedor.

Outra característica do sistema que também é relevante destacar é a classe de avaliação, campo obrigatório do novo sistema que se localiza dentro de uma das visões de contabilidade. Este campo é ligado a uma classe de contas contábeis correspondente a ela, isso quer dizer que toda escrituração contábil é baseada nesta informação e qualquer erro ou falha na escolha ou no controle deste campo impactará na contabilização da empresa e no ciclo de vida do material ou produto. A contabilização acontece na entrada, na saída e no consumo do material de forma automática. Este processo é ativado ao dar entrada no item no sistema e o movimento de lançamento é previamente configurado antes da entrada no estoque para a correta contabilização do item em todas as fases da sua utilização.

Com todas essas características e especificidades, é impensável implementar um sistema gerencial deste porte sem dar uma atenção especial ao processo de catálogo de materiais e sem exercer uma gestão contínua sobre ele para que essas minúcias não comprometam as atividades da cadeia produtiva da empresa, uma vez que essas ações são tratadas no ato do cadastro do item.

O processo de migração para o novo sistema

Durante a fase de preparação para a migração dos dados e carga dos itens existentes em estoque no sistema anterior, foi necessário criar alguns critérios para se iniciar com um sistema enxuto e facilitar todos os controles necessários na nova forma de gerenciar o catálogo de materiais. Neste momento, a parte mais importante foi garantir que o novo catálogo contivesse apenas itens em estoque e com pedidos de compras em andamento; os demais seriam migrados para o novo sistema conforme a necessidade.

Para a garantia do sucesso desta fase, em relação ao módulo específico de gestão de materiais, foi montada uma estratégia que consistia em gerar relatórios extraídos do sistema antigo, criar planilhas dos relatórios, sanear as planilhas por tipo de material, e vincular os dados das planilhas com os campos obrigatórios e relevantes do novo sistema. Campo obrigatório é aquele em que não é possível prosseguir com o cadastro sem o seu preenchimento, e campo relevante é aquele impacta os demais processos de negócio da empresa, mesmo que o sistema permita prosseguir com o cadastro sem preenche-lo. As planilhas foram confeccionadas separadamente, por tipo de material, para serem entregues ao analista visando à sua unificação para o procedimento de carga no novo sistema. Com as planilhas unificadas e preenchidas, foi iniciado o processo de carga, no novo sistema, dos itens que estavam no estoque físico do almoxarifado e dos que estavam com processo de compras em andamento. Neste momento, para que o novo sistema começasse baseado nos conceitos pré-estabelecidos para a gestão moderna do catálogo, foram feitas as ações de migração dos dados contemplando todo o trabalho de saneamento realizado no catálogo.

Cadastro de materiais e serviços – sistema novo

Considerando a quantidade de informações novas que seria preciso para o cadastro de um item no novo sistema e que eram de responsabilidade de outras áreas da empresa, foi idealizado um recurso de workflow para que todas as áreas envolvidas pudessem fornecer informações. O workflow de solicitação de cadastro foi idealizado da seguinte forma: o solicitante envia e-mail a uma das três áreas centralizadoras, de acordo com o tipo de material a ser criado. Após análise, o cadastrador da área centralizadora preenche as informações primárias de sua responsabilidade nas visões “Dados Básicos 1 e Dados Básicos 2”. Neste momento, o sistema envia um e-mail informando ao próximo responsável que deverá preencher sua visão e assim sucessivamente até o cadastro completo do item. Após o cadastro da última visão, o sistema envia e-mail para a área centralizadora que iniciou o cadastro informando a conclusão. A área centralizadora analisa todas as visões cadastradas e libera o material para utilização. A figura 4 apresenta o fluxograma inicial para cadastro de um item.

Figura 4. Processo de cadastro de itens no sistema novo

Figura5

Fonte: Os próprios autores (2016).

Na figura 4, os processos na cor azul são realizados fora do sistema e os na cor verde são realizados dentro do sistema. Este modelo foi proposto com o objetivo de aprimorar o recurso original do workflow do novo sistema. Porém, após a sua implementação, ainda seria necessário avaliar a sua eficácia em relação ao controle dos dados cadastrados e ao tempo para finalizar um cadastro, já que esta atividade dependia das ações de uma grande quantidade de pessoas e áreas.

Ainda sobre o novo processo de cadastro, é relevante destacar o cadastro das visões que também são usadas nos diversos momentos em que os materiais são usados. O cadastro de uma visão depende do tipo e da especificidade do material a ser cadastrado e, para definir quais visões seriam cadastradas no novo sistema, realizou-se uma análise criteriosa dos tipos de materiais usados no laboratório. Na figura 5, pode-se visualizar o esquema montado a partir desta análise para definir o cadastro das visões.

Figura 5. Tipo de material x visões

Figura6

Fonte: Os próprios autores (2016). MRP: Planejamento das Necessidades de Materiais (Material Requeriment Planning); SD: Vendas e Distribuição (Sales and Distribution)

Num sistema integrado, o cadastro é muito específico e as visões são obrigatórias por tipo de material, como é possível verificar na figura acima. Além disso, dentro das visões obrigatórias, os campos a serem preenchidos podem ser diferentes para cada tipo de material. Com toda essa especificidade do cadastro de materiais, foi necessário um treinamento minucioso da equipe cadastradora para que possíveis erros fossem minimizados e/ou evitados. Esses campos têm impacto direto no ciclo de vida do material desde a sua compra até a utilização pelo usuário. Com essas ações, que permitiram a migração dos dados e dos materiais em estoque do sistema antigo para o novo sistema, este pode começar a operar.

Análise do processo implementado

Com o sistema em operação e o andamento das atividades de cadastro, foi verificado que o tempo do cadastro estava muito superior ao esperado. O motivo identificado foi que, apesar de existirem três áreas centralizadoras, as demais visões do cadastro eram preenchidas de forma descentralizada pelos solicitantes. Isso ocorreu porque a estratégia inicialmente utilizada foi dividir as atividades com os responsáveis pelas informações de cada tipo de material, situação que fez o cadastro perpassar por nove setores para sua finalização. Este modelo também impossibilitou definir um prazo máximo para o cadastro do item, uma vez que era impossível controlar as informações cadastradas e o tempo em que elas eram feitas, já que eram realizados por outros setores e não pelas áreas centralizadoras.

Por causa de uma limitação do sistema, não era possível identificar de forma rápida em qual setor o cadastro do item estava parado, o que impossibilitava a área centralizadora de finalizar os cadastros já iniciados. No modelo inicial, formou-se uma frente de trabalho com 18 colaboradores para o preenchimento das 12 visões impostas pelo sistema, nove para cadastrar e outros nove para substituí-los nos casos de ausências. Neste modelo também não se conseguiu definir uma área específica para o atendimento aos problemas que estavam sendo identificados após o cadastro ser iniciado e/ou concluído.

Solução para os problemas identificados

Considerando que a carga dos dados constantes no catálogo de materiais era o fator primordial para o início do novo sistema, ele não poderia ser implementado sem que a empresa atendesse às exigências e peculiaridades do novo modelo de cadastro e apresentasse uma solução para sua implementação e para a gestão deste catálogo após o início do funcionamento. Considerando, também, a importância estratégica do catálogo para a cadeia produtiva da empresa, a mudança proposta não seria possível sem um olhar especial sobre esta atividade, o que demandou uma gestão minuciosa do catálogo para garantir que os processos não fossem impactados por falhas nos dados mestres dos materiais cadastrados. Com um Departamento de Logística estruturado para dar suporte à logística interna do laboratório, a falta de uma área dedicada à gestão do catálogo era uma ameaça à estratégia proposta de manter um catálogo de materiais moderno e enxuto. Com base nesses argumentos, propôs-se a criação de uma área para gerenciar o catálogo no sistema novo. A direção aceitou a proposta e respaldou todas as ações necessárias para a implementação de uma gestão completa do seu catálogo de materiais com a centralização desta atividade neste setor.

Para que o cadastro fosse efetuado com a melhor qualidade e o menor tempo possíveis, foram realizadas algumas alterações nos processos adotados inicialmente. A mudança de maior impacto foi a criação de um setor dedicado ao cadastro dos itens e à gestão do catálogo de materiais, este setor ficou diretamente ligado ao Departamento de Logística da unidade.

Cadastro de materiais e serviços – modelo proposto

Em função da quantidade de informações necessárias ao cadastro de um item que são de responsabilidade de outros setores, montou-se uma estratégia de comunicação e interação com eles para evitar o erro na escolha do tipo de material, assim como na sua classe de avaliação. Um erro nessas duas informações causará problemas em todos os setores da empresa que utilizarão o material e naqueles que são impactados com sua movimentação. O contato com o Setor de Patrimônio e o Setor Contábil/Fiscal, por exemplo, se dá por e-mail antes do início da criação do material. O Setor da Garantia da Qualidade preparou um documento padrão para preenchimento das informações de sua responsabilidade. Já com o setor de Planejamento e Controle da Produção (PCP), que solicita cadastro apenas de itens usados na produção de medicamentos, não foi possível adotar nenhum dos dois procedimentos anteriores, pois existe uma variedade de informações a serem preenchidas de acordo com o produto a ser fabricado. O setor de PCP acessará o cadastro já realizado e ampliará as visões de sua responsabilidade. Na figura 6 pode-se ver o desenho do novo processo.

Figura 6. Novo processo de cadastro

Figura7

Fonte: Os próprios autores (2016).

Conforme demonstrado na figura acima, as atividades em azul são executadas fora do sistema e as em verde são executadas no sistema. Este modelo foi proposto em substituição ao modelo inicial que era demorado e envolvia muitas áreas e pessoas. O modelo proposto foi necessário para solucionar os problemas encontrados com a implementação do novo sistema que, se não modificado, impactaria em toda a cadeia produtiva. A criação de um setor específico para gerenciar o catálogo de materiais do laboratório permitiu um acompanhamento rotineiro de todas as variáveis que influenciam a utilização dos itens cadastrados, além de oferecer assessoria aos demais setores da empresa que necessitam fazer alterações em seus processos que impactarão o catálogo. Outra vantagem foi a possibilidade de padronizar o cadastro na descrição e nas unidades de medidas juntamente com a área de qualidade da empresa.

RESULTADOS

Com a implementação da estratégia proposta de gerenciar o catálogo de materiais, criando um setor específico para esta atividade, puderam-se identificar algumas vantagens e resultados. São eles:

Esses resultados apontam para a resolução das questões que estavam impactando as estratégias da empresa, sendo as principais delas: a necessidade implementação do novo ERP adquirido pelo laboratório e a necessidade de reestruturação do processo de cadastro de materiais que não era gerenciado adequadamente.

Nas figuras 7 e 8 pode-se observar as atividades de gerenciamento do catálogo realizadas pela equipe, que possibilitam a interação com todos os usuários do laboratório para garantir que as demandas deles sejam atendidas com segurança, além de manter o catálogo enxuto e atualizado, sendo este um dos principais ganhos com o modelo proposto.

Figura 7. Atividades de gerenciamento do catálogo em 2016

Figura8

Fonte: Os próprios autores (2016)

Figura 8. Atividades de gerenciamento do catálogo em 2017

Figura9

Fonte: Os próprios autores (2017)

CONCLUSÃO

O estudo permitiu constatar que o laboratório se via realmente diante de um problema em função do momento novo, uma vez que ele não tinha um modelo de gestão de catálogo de materiais estabelecido e atuava há bastante tempo com um sistema gerencial próprio que não atendia às exigências de um sistema integrado e com uma lógica empresarial. Diante disso, foi necessário lançar mão de alguma estratégia que permitisse a continuidade da implementação do sistema adquirido, que foi objeto de um pesado investimento financeiro.

Durante a pesquisa, observou-se que os gestores envolvidos no problema tinham um grande desafio que, de forma estratégica, foi trabalhado em etapas conforme descrito neste artigo. O ponto chave para viabilizar a solução do problema foi a criação de um setor específico, com uma equipe qualificada e dedicada exclusivamente às atividades que envolvem o cadastro dos materiais e a gestão do catálogo. Tal fato trouxe confiança e credibilidade tanto para a alta direção quanto para os usuários finais, fatores considerados importantes para o sucesso da estratégia que envolveu recursos materiais e humanos. Para tratar de questões que envolvem a gestão das empresas, é importante que os profissionais envolvidos nas tomadas de decisão tenham conhecimento prático e teórico para analisar criticamente os impactos envolvidos, conseguir interagir com todas as áreas interessadas para transmitir confiança e credibilidade e engajar o maior número de pessoas na aceitação das soluções propostas. A criação da área de gestão de catálogo de materiais composta por profissionais formados em administração, logística e gestão de cadeia de suprimentos foi um fator que contribuiu para os resultados alcançados.

As análises mostraram que o modelo anterior impossibilitava a implementação do novo sistema, pois os novos dados mestres que seriam necessários não existiam. Dessa forma, o mapeamento e a modelagem do processo realizados permitiram identificar os pontos exatos que precisavam de intervenção. Essas duas formas de análise de processos permitiram identificar as falhas e planilhar todos os dados necessários ao novo sistema, os quais serviram de base para a migração do sistema anterior para o adquirido. Neste momento, identificou-se que a estratégia gerencial utilizada estava no caminho certo para as demais ações idealizadas.

As estratégias que se seguiram, permitiram o monitoramento dos impactos. Dentre elas, destaca-se a mudança que precisou ser feita na utilização do recurso sistêmico de workflow que, inicialmente, não deu os resultados esperados. A decisão de centralizar o cadastro num setor, ao invés de manter em mais de uma área centralizadora, também trouxe ganhos porque reduziu consideravelmente o tempo de cadastro de um item, além de garantir que os dados mestres cadastrados fossem os realmente necessários. Uma forma de observar a importância do modelo proposto com uma gestão contínua do catálogo é comparar a quantidade de cadastros realizados e das atividades de gestão nos anos de 2016 e 2017. Com o aumento da quantidade de cadastros, as atividades de gestão do catálogo aumentaram na mesma proporção, conforme demonstrado nas figuras 7 e 8. Isso foi necessário para evitar duplicidades, cadastros desnecessários e garantir dados mestres corretos que são responsáveis pela contabilização das movimentações dos materiais, o que só foi possível mediante essas atividades de gestão.

Pelo exposto, conclui-se que a experiência pesquisada trouxe significativos avanços para a gestão do laboratório, principalmente no que diz respeito a problemática enfrentada com a ausência da gestão do catálogo, que impossibilitava uma decisão estratégica da alta direção de implementar um sistema gerencial novo para melhorar os resultados e o cumprimento da missão institucional. Empresas que atuam num segmento de grande competitividade, como é o caso da indústria farmacêutica, precisam ter processos otimizados e níveis de serviços com padrões que permitam a oferta de produtos com o menor custo de produção, além de uma cadeia de suprimentos eficaz para atender às demandas internas e externas. Neste sentido, investimentos na modernização da gestão dos processos são de extrema importância na gestão dessas empresas.

REFERÊNCIAS

Ballou H. R. (1993), Logística Empresarial: Transporte, Administração de Material e Distribuição Física, Atlas, São Paulo.

Barbieri, J.C.; Machline, C. (2009), Logística Hospitalar: teoria e prática, 2.ed., Saraiva, São Paulo.

Bastos, D. (2015), A Gestão da Logística Empresarial como Mecanismo de Melhoria de Processos em Laboratórios Farmacêuticos Oficiais. Dissertação (Mestrado em Gestão, Pesquisa e Desenvolvimento na Indústria Farmacêutica) - Instituto de Tecnologia em Fármacos/Farmanguinhos, Rio de Janeiro.

Bowersox, D. J.; Closs, D. J. (2001), Logística empresarial: o processo de integração da cadeia de suprimento, Atlas, São Paulo.

Brasil (1988), Constituição Federal da República Federativa do Brasil, Senado Federal, Brasília, DF.

Brasil (1993), Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF.

Bresser-Pereira, L. C. (1998), Gestão do setor público: estratégia e estrutura para um novo Estado, em Bresser-Pereira, L. C.; Spink, P. (Org)., Reforma do Estado e Administração Pública Gerencial, FGV, Rio de Janeiro, pp. 21-38.

Gadelha, C. A. G. (Coord.) (2012), A dinâmica do sistema produtivo da saúde: inovação e complexo econômico-industrial, Fiocruz, Rio de Janeiro.

Gomes, A. S. (2010), Padronização das Descrições de Materiais (PDM), artigo apresentado no III Congresso Consad de Gestão Pública, 15-17 mar. 2010, Brasília, DF.

Magalhães, J. L.; Antunes, A. M. S.; Boechat, N. (2011), Laboratórios farmacêuticos oficiais e sua relevância para saúde pública do Brasil, RECIIS – Revista Eletrônica de Comunicação, Informação, Inovação em Saúde, Vol. 5, No. 1, pp.85-99.

Mattos, F. J. A. S.; Pontes, A. T.; Gutierrez, R. H. (2017), Classificação e Catalogação de Materiais, uma Metodologia Essencial na Gestão Empresarial, artigo apresentado ao Congresso Internacional de Administração - ADM 2017, 25-29 set. 2017, Ponto Grossa, Paraná.

Ortolani, L. F. B. (2001), Logística: Gestão de estoques e sistemas de informação, instrumentos imprescindíveis para a eficiência nas organizações públicas e privadas, Bate Byte, Florianópolis.

Portal ERP (2014), Empresa de logística centraliza cadastro de materiais, disponível em: https://portalerp.com/mercado/1148-empresa-de-logistica-centraliza-cadastro-de-materiais (Acesso em 18 jul. 2018)

Severino Filho, J. (2006), Administração de Logística Integrada: materiais, PCP e marketing, E -papers, Rio de Janeiro.


Recebido: 23 abr. 2018

Aprovado: 01 jul. 2018

DOI: 10.20985/1980-5160.2018.v13n3.1421

Como citar: Bastos, D. S.; Lourenço, S. Z.; Guedes, C. C. et al. (2018), “A importância da gestão do catálogo de materiais para o processo de suprimento – um estudo de caso”, Sistemas & Gestão, Vol. 13, No. 3, pp. pp.378-393, disponível em: http://www.revistasg.uff.br/index.php/sg/article/view/1421 (acesso dia mês abreviado. ano).