Metodologia para seleção de microbacias de drenagem urbana para implantação de microreservatórios: estudo de caso da bacia da Tijuca, RJ

Alfredo Akira Ohnuma Jr.

akira@uerj.br

Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.

Marcelo Obraczka

obraczka@ppe.ufrj.br

Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.

Luis Carlos Soares da Silva Jr.

lcsoareseng@gmail.com

Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.

Isaias Fagundes Leal

isaiasfagundesleal@gmail.com

Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.

Bruno Muricy

isaiasfagundesleal@gmail.com

Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.


RESUMO

As áreas mais densamente urbanizadas vêm sofrendo crescentemente com problemas relacionados a cheias e enchentes, devido à falta de capacidade dos sistemas de drenagem existentes. Atualmente, diversas alternativas de projetos têm sido apresentadas, como medidas não convencionais de drenagem urbana com o objetivo de reduzir os impactos do escoamento superficial em áreas urbanizadas, a exemplo da implementação de sistemas de retardo e de retenção a montante, além do compartilhamento da responsabilidade entre atores públicos e privados. O presente trabalho visa definir critérios específicos para seleção de microbacias de drenagem urbana, que apresentem maior viabilidade de implementação de microreservatórios de captação e armazenamento de água da chuva em lotes distribuídos em determinada região. A metodologia consiste na análise de duas áreas distintas na Grande Tijuca, Rio de Janeiro, RJ, região historicamente bastante afetada por inundações urbanas. Foi realizada a seleção e a hierarquização de microbacias de drenagem com maior potencial de implantação de microreservatórios, a partir de critérios, entre os quais: (1) existência de grandes áreas impermeabilizadas, especialmente coberturas e telhados; (2) reduzida eficiência/capacidade operacional dos sistemas locais de microdrenagem existentes; (3) inexistência de bacias externas e/ou de remanso do corpo receptor e; (4) potencial do aproveitamento das águas pluviais armazenadas. De acordo com os critérios estabelecidos, torna-se viável a definição de áreas prioritárias para implementação de amortecimento a montante por meio de microreservatórios nos lotes, aumentando os possíveis benefícios da utilização dessa técnica. Recomenda-se trabalhos futuros que aprofundem os estudos de viabilidade, com a realização de modelagens hidrológica e hidráulica das bacias e respetivos sistemas de drenagem.

Palavras-chave: Drenagem urbana; Microreservatórios em áreas particulares; Retenção a montante; Amortecimento de picos de vazão.

INTRODUÇÃO

Os estudos de drenagem urbana se devem, sobretudo, a expansão da urbanização e dos adensamentos populacionais aliada aos aspectos de crescente impermeabilização e carências de planejamento e controle do uso do solo urbano (Canholi, 2005). A cidade do Rio de Janeiro, RJ tem observado eventos de precipitação com inundações mais frequentes, sobretudo nas décadas de 2000 e 2010, sendo a região da Tijuca uma das mais afetadas (Castro Corrêa et al., 2017). Na visão higienista convencional predomina o conceito que prioriza o rápido afastamento do deflúvio para jusante, a partir do emprego de um sistema de rede de galerias pluviais descaracterizada de condições de armazenamento. Dessa forma, em determinados casos, verificou-se que simplesmente adotar soluções dessa tipologia, como a retificação e a canalização de rios e a diminuição da rugosidade e o aumento da seção hidráulica das canalizações, reduzem o tempo de concentração da bacia, com efeitos na superposição de picos de cheias a jusante, dentre outros parâmetros hidrológicos (Tucci et al., 1995).

Com base no conceito de amortecimento, a partir de uma experiência bem-sucedida na cidade de São Paulo (Canholi, 2005), foi iniciado no município do Rio de Janeiro o Programa de Controle de Enchentes da Grande Tijuca (PCEGT), sob a coordenação da Fundação Rio Águas, com a implantação de quatro reservatórios de amortecimento de cheias na região da bacia da Tijuca e arredores, além de um túnel extravasor do rio Joana para a baía de Guanabara (Fundação Rio Águas, 2010). A execução desse programa, a partir da execução de obras de contenção de cheias na Grande Tijuca, se justifica principalmente em função da sobrecarga no sistema de macrodrenagem na bacia do Mangue, sobretudo dos rios Joana, Trapicheiros e Maracanã (Canholi et Graciosa, 2011).

Por outro lado, constata-se que os problemas de maior complexidade e envergadura que atualmente atingem a drenagem urbana não conseguem ser sanados apenas com a adoção de iniciativas e intervenções localizadas e de caráter estrutural, como bem demonstra a experiência recente desses reservatórios. Apesar da melhoria da situação, verificada nos últimos anos a partir da implantação desse programa e confirmada pela própria população local, o novo sistema, ainda que não totalmente implantado, não foi suficientemente capaz de impedir a grande inundação ocorrida na região em março de 2016.

Dentro de uma perspectiva mais ampla, visando se obter uma maior eficácia no enfrentamento e na solução desses problemas, deve ser considerado um conjunto de alternativas, sob uma ótica holística capaz de englobar um leque de intervenções, tanto corretivas como de gestão e planejamento. Santos (2016) sustenta que em muitos países se faz necessário promover medidas de drenagem de cunho mais sustentável, inclusive para assegurar a sustentabilidade de seus sistemas de abastecimento de água e restabelecer o ciclo hidrológico na própria bacia.

Comparadas com os grandes reservatórios de amortecimento a jusante da bacia, soluções de retenção/amortecimento mais a montante da bacia ocupam menos áreas, além de possuírem custo reduzido e descentralizarem as atividades de operação e manutenção dos sistemas junto a agenda das administrações públicas e órgãos gestores. Essas técnicas e dispositivos já são bastante difundidos em países desenvolvidos, como EUA, Canadá e Japão, podendo ser citadas a captação, a infiltração, o amortecimento e a retenção do deflúvio na origem (Canholi, 2005). Telhados verdes, captação e infiltração e /ou utilização de águas de telhado, ruas mais sinuosas, pavimentação mais permeável, bacias de detenção e estrangulamentos de seção de entrada são outros exemplos da aplicação desse conceito (Tucci et al., 1995b).

Outra questão que deve ser abordada diz respeito a conceitos mais recentes de compartilhamento da responsabilidade pela drenagem: em algumas cidades dos EUA, novos empreendimentos não são licenciados/aceitos se não comprovarem a adoção de medidas que possibilitarão não haver aumento do deflúvio a jusante dos locais onde serão instalados. Sob esse prisma, a cidade de Porto Alegre apresentou uma medida inovadora nesse sentido, somente sendo permitido que novos empreendimentos gerem um incremento máximo de deflúvio após sua implantação na respectiva bacia de drenagem (Porto Alegre, 2014).

A implantação desses conceitos aplicados na legislação brasileira ainda hoje se apresenta de forma incipiente, já que dos 5.570 municípios do País, somente quatro tornam compulsória a adoção de reservatórios de acumulação e retenção de águas de chuva para novos empreendimentos com áreas impermeabilizadas superiores a 500 m². O município do Rio de Janeiro aborda o assunto no Decreto nº 23.940/2004, e os municípios de São Paulo, Niterói e Nova Iguaçu nas Leis nº 41.814/2002, nº 2.630/2009 e nº 4.092/2011, respectivamente. Além disso, o estado de São Paulo também aplicou esta obrigatoriedade ao instituir a Lei nº 12.526/2007. De acordo com o Quadro 1, pode-se observar o resumo das legislações citadas.

Quadro 1. Aspectos e características de legislação pertinente ao emprego de microreservatórios no Brasil

Figura1

Fonte: Os próprios autores (2018)

1 V: volume do reservatório (m³); k: coeficiente de abatimento (adimensional) [correspondente a 0,15]; Ai: Área impermeabilizada (m²); h: altura de chuva (m) [correspondente a 0,06 m nas Áreas de Planejamento 1, 2 e 4 e a 0,07 m nas Áreas de Planejamento 3 e 5].

2 V:volume do reservatório (m³); Ai: área impermeabilizada (m²); IP: índice pluviométrico (m/h) [correspondente a 0,06 m/h]; t: tempo de duração da chuva (h) [correspondente a 1 hora].

Especificamente no Rio de Janeiro, há exemplos distintos de iniciativas pontuais e localizadas, como do sistema de captação de águas pluviais do Instituto de Aplicação Fernando Rodrigues da Silveira (CAp/UERJ) (Guimarães, 2016). Localizado no bairro do Rio Comprido, o CAp/UERJ possui um reservatório com capacidade para 2.460 litros, utilizado para caracterização de águas de chuva em diferentes pontos de armazenamento, com proposta para o emprego da água em atividades menos nobres como irrigação de jardim e limpeza (Souza et al., 2017). Na região norte do município do Rio de Janeiro, o Parque Ari Barroso, situado no bairro da Penha, também conta com um reservatório enterrado de 3,0 metros de largura por 3,0 metros de comprimento e 1,2 metros de profundidade, cuja área de contribuição é o telhado da Arena Dicró, com aproximadamente 500 m². Os cálculos realizados verificam que o reservatório existente, com um volume total de 10,8 m³, está dimensionado de acordo com as metodologias apresentadas (Alvarez, 2017).

Seguindo essa filosofia, o projeto de remodelação da Praça do Alto em Teresópolis, onde ocorre a principal feira da cidade, prevê a implantação de um sistema/reservatório para águas pluviais para amortecimento e posterior uso em sanitários, irrigação e limpeza/lavagens em atendimento às demandas locais. O uso de microreservatórios de amortecimento não se limita apenas ao estado do Rio de Janeiro e ao Brasil, sendo também utilizado em outros estados como São Paulo, Distrito Federal, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Espírito Santo e Paraná. Seu emprego já é bastante difundido no exterior, agregado à reutilização da água, como, por exemplo, na Austrália. Segundo o Australian Bureau of Statistics (2013), mais de um terço (34%) das casas utilizam reservatórios de coleta de águas pluviais instaladas. A Swinburne University of Technology construiu dois reservatórios subterrâneos no seu campus de Melbourne, Austrália, com capacidade combinada de 295 m³, cujo objetivo é capturar águas pluviais dos telhados de determinadas edificações e usá-las para irrigação (Imteaz et al., 2009).

O projeto desta pesquisa se iniciou em 2017, viabilizado através de uma parceria entre técnicos do Departamento de Engenharia Sanitária da UERJ e da Fundação Rio Águas, no sentido de se estudar soluções para os problemas de drenagem recorrentes e localizados, enfrentados por muitas regiões no município do Rio de Janeiro, a partir do emprego de técnicas não convencionais, como é o caso da retenção e amortecimento na origem por meio de estruturas como os microreservatórios.

Tendo em vista a importância crescente da aplicação dessas técnicas para melhoria da drenagem urbana, incluindo a existência de legislação municipal que incentive o seu emprego no RJ, o presente trabalho possui como objetivo geral aprofundar o conhecimento sobre o amortecimento a partir do emprego de microreservatórios em áreas particulares.

Como objetivos específicos foram elencados: (1) avaliar e propor uma metodologia de análise do potencial e viabilidade de emprego dessa técnica, incluindo a possibilidade de reuso da água captada; (2) hierarquizar as microbacias de drenagem urbana de áreas selecionadas na bacia da Tijuca, de acordo com a metodologia proposta; e (3) identificar, nas áreas selecionadas, exemplos/casos de edificações que apresentem condições desejáveis e apropriadas para a implementação de sistemas de armazenamento de água de chuva nos lotes.

METODOLOGIA

Com base em pesquisas bibliográficas, artigos técnicos e científicos, além de consultas aos órgãos competentes, como a Fundação Rio-Águas, foram primeiramente levantados dados gerais sobre o estado da arte do emprego de dispositivos de retenção na origem, em especial quanto à metodologia/técnica de microreservatórios de amortecimento. Em seguida, com o suporte de técnicos da Rio-Águas, com experiência adquirida na operação e gestão desses sistemas no município do RJ, desenvolveu-se o processo de definição da área a ser adotada como estudo de caso, tendo sido selecionada a bacia da Tijuca.

A área de estudo

Entre outros aspectos, a bacia da Tijuca foi adotada como área de estudo por abranger uma extensa área com ocupação formal e urbanização consolidada e por apresentar muitos problemas de drenagem, com a ocorrência frequente de alagamentos e enchentes, em parte por causa da saturação de alguns dos seus sistemas/redes de microdrenagem.

Na sequência, foram levantados dados referentes à área de estudo adotada (Tijuca) para sua caracterização e contextualização, identificando a existência de pontos de alagamento por conta de insuficiência do sistema de microdrenagem local, entre outros aspectos.

Foi também realizado um levantamento prévio de pontos críticos, discriminando-se as áreas de abrangência das principais manchas de inundação na área de interesse. Na escolha das áreas a serem avaliadas, esses sítios foram evitados, pois, manchas, remansos e outras situações dessa natureza podem interferir no desenvolvimento e nos resultados do estudo. Isso é passível de ocorrer uma vez que o funcionamento inadequado da drenagem pode estar acontecendo não em função das insuficiências específicas da rede de microdrenagem, mas sim por influência de outros fatores, tais como o afogamento dos seus desagues na macrodrenagem e a afluência de vazões de extravasamento de outras sub-bacias adjacentes.

Os dados referentes aos limites das bacias, sub-bacias, projetos e cadastros das respectivas redes de microdrenagem foram obtidos junto ao setor de cadastro da Fundação Rio-Águas, que também foi consultada no que se refere à indicação de sistemas de microdrenagem que se apresentem mais saturados e/ou onde há maior necessidade de remanejamento.

Além de dados do cadastro da Fundação Rio-Águas, foram também utilizadas informações de campo, incluindo consultas aos técnicos do município, como: a) a existência/localização de áreas mais críticas de drenagem; b) locais onde há extravasamento de vazões excedentes de uma bacia à outra adjacente, em função da perda da capacidade de retenção de água pluvial na bacia de captação e da eficiência do sistema convencional na rede de drenagem na bacia de origem; e c) locais que sofrem maior influência de remansos dos respectivos corpos receptores.

A Figura 1 ilustra a região/bairro da Tijuca, incluindo dois dos seus principais corpos hídricos, o rio Joana e o rio Maracanã. Devido às grandes dimensões da região adotada, foram definidas duas áreas específicas a serem avaliadas prioritariamente, denominadas como Área 1 e Área 2.

Essas duas áreas apresentam características indicadoras de bom potencial para o desenvolvimento dos estudos referentes à adoção de dispositivos de amortecimento e a consequente melhoria das condições de drenagem locais. Entre essas características podem ser citadas a existência/ocorrência de: (1) elevada impermeabilização, (2) problemas crônicos de microdrenagem, constatados na prática, inclusive para chuvas menos intensas; e (3) boa disponibilidade de dados de chuva e de cadastro/projeto das redes e galerias de águas pluviais locais.

A Área 1 se situa mais a jusante da bacia adotada (Tijuca) em relação à Área 2, estando localizada entre os rios Joana e Maracanã. Por outro lado, a Área 2 drena para o Rio Joana. (Figura 2)

Figura 1. Localização/situação da área priorizada para o estudo (Tijuca), incluindo seus principais corpos hídricos: os rios Joana e Maracanã. Rio de Janeiro, Brasil, 2018

Figura2

Fonte: adapatado de Google Earth (2018).

Figura 2. Localização das Áreas 1 e 2 na região da Tijuca. Rio de Janeiro, Brasil, 2018

Figura3

Fonte: Os próprios autores (2018)

Enquanto que a Área 2 possui uma ocupação composta por agrupamentos de edificações, como condomínios de prédios, onde predominam vias internas de acesso, a Área 1 é predominantemente composta por lotes e edificações servidas por arruamentos da malha viária pública.

Por considerar-se que ela representa de forma mais abrangente o universo estudado (Bacia da Tijuca) e a realidade dessa região, a Área 1 foi então adotada para detalhamento e análise específica de microbacias e respectivos sistemas de microdrenagem. Os limites dessas microbacias foram definidos com base em critérios topográficos, grade dos arruamentos e situação das redes e galerias de águas pluviais disponíveis.

Para melhor analisar as características que possam justificar o emprego dos microreservatórios, essa área foi subdividida nas sub-bacias A, B, C, D, E, F, E e G (Figura 3).

Figura 3. Divisão das sub-bacias da Área 1. Região da Tijuca, Rio de Janeiro, Brasil, 2018

Figura4

Fonte: Os próprios autores (2018)

Para a determinação e hierarquização daquelas que serão modeladas prioritariamente, foi desenvolvida uma metodologia na qual são avaliados alguns aspectos específicos que indiquem se há ou não uma maior aptidão/viabilidade quanto à adoção da técnica de amortecimento utilizando os microreservatórios. Para nortear essa análise prévia foram elencadas dez condições de contorno/características desejáveis, as quais estão discriminadas e justificadas a seguir:

  1. A microbacia não deve receber contribuição de deflúvios de bacia externa, visando minimizar influência de vazões externas que possam deturpar os resultados e\ou tornar o amortecimento insignificante;

  2. Possuir área inferior a 3 km², de forma a possibilitar o emprego do Método Racional e a simplificação dos cálculos e das modelagens hidrológicas e hidráulicas posteriores;

  3. Deve ser provida de cadastro do sistema de drenagem existente, o que possibilita avaliar o desempenho hidráulico das galerias nos cenários pré e pós-implantação dos sistemas de amortecimento (microreservatórios);

  4. O sistema existente não deve estar funcionando adequadamente na ocorrência de chuvas mais frequentes, como aquelas referentes a períodos de recorrência inferiores a dois anos. Depreende-se que haja, nesses casos, maior interesse do poder público em dar solução emergencial ao problema, aumentando a viabilidade do emprego de sistemas de amortecimento intralotes que poderiam eliminar ou postergar a necessidade de remanejamento/aumento da capacidade do sistema convencional (galerias);

  5. Os pontos de extravasamento e\ou alagamentos identificados não devem ser decorrentes da afluência de vazões externas à microbacia e/ou serem influenciados/causados por fenômenos de remanso da macrodrenagem e dos corpos hídricos receptores dos desagues dos sistemas de microdrenagem em análise. Esse aspecto visa impedir a existência de fatores/influências externas que possam deturpar ou invalidar os resultados das modelagens pré e pós-implantação de sistemas de amortecimento intralotes;

  6. A área em análise deve dispor da maior quantidade de microreservatórios já implantados, viabilizando uma análise do funcionamento e da implantação de sistemas de amortecimento ou microreservatórios para retenção na origem;

  7. Conter maior número de lotes com áreas iguais ou superiores a 500 m², o que aumenta a necessidade/viabilidade para implantação de microreservatórios, a partir das exigências da legislação pertinente.

  8. Possuir maiores áreas de telhados nos lotes (área edificada) e que preponderem em relação à área total. Esse aspecto aumenta a viabilidade de implantação de sistemas de amortecimento ou microreservatórios na origem, pela maior capacidade de interceptação e coleta de águas meteóricas;

  9. Dispor de maiores áreas individuais de telhados, o que incrementa a viabilidade técnica e econômica de implantação de sistemas de amortecimento ou microreservatórios na origem, por reduzir o número necessário desses dispositivos para o mesmo volume de amortecimento/armazenamento;

  10. Dispor de maior quantidade de condomínios/grupamentos de prédios com pavimentos destinados à garagem e áreas verdes. Esse aspecto aumenta o interesse e/ou a viabilidade de implantação de sistemas de amortecimento ou microreservatórios na origem, com vistas também ao reuso da água armazenada.

Para a presença de cada critério foi atribuído um ponto; em caso de sua ausência atribuiu-se 0. Ao final, calculou-se o somatório de pontos obtido para cada sistema/microbacia, com posterior hierarquização, adotando-se um mesmo peso ou importância para todos os aspectos avaliados.

Para fins de comparação, foi acrescentada uma coluna referente à Área 2, que foi avaliada como um todo. Em seguida, foram selecionadas a(s) sub-bacia(s)/subsistema(s) com maior pontuação no somatório geral para serem objeto de uma análise mais específica.

Para esses casos, com auxílio de ferramenta própria do software utilizado (AutoCAD), foram identificadas e quantificadas as diversas tipologias de áreas de lotes, coberturas, telhados e pavimentação, que foram confirmadas por análise visual através do Google Earth.

Na sequência, com o auxílio da ferramenta Street View do Google Earth, foram identificados os casos de edificações/prédios nessas sub-bacias com condições mais propensas à implementação de microreservatórios para fins de reuso. Para tal, verificou-se a existência dos elementos considerados desejáveis para o reuso, entre os quais: grandes áreas verdes e comuns; disponibilidade de áreas livres para construção de reservatórios/cisternas; número elevado de vagas de garagem; grandes áreas de telhados/coberturas; localização em área com histórico de problemas de abastecimento de água por parte do sistema público; e sujeição à pagamento de tarifa de esgoto.

RESULTADOS

De acordo com a Tabela 1, é possível verificar que as microbacias de drenagem da Área 1 apresentam características mais indicativas de maior viabilidade quanto ao emprego dos microreservatórios nos lotes e áreas particulares.

Tabela 1. Pontuação dos critérios utilizados para determinação da maior viabilidade de adoção de microreservatórios nas microbacias das Áreas 1 e 2. Região da Tijuca, Rio de Janeiro, Brasil, 2018

Figura5

Fonte: Os próprios autores (2018)

Notas: * Valor inicialmente arbitrado que será melhor aferido com a continuidade do projeto de pesquisa

De acordo com os resultados, as sub-bacias C e E da Área 1 são aquelas com maior potencial para o desenvolvimento de sistemas de captação e armazenamento de águas pluviais. Pontuando em todos os critérios estabelecidos, essas áreas demonstram atender de forma mais abrangente às características desejáveis para a viabilização do emprego de microreservatórios, com o objetivo de atenuar picos de chuva e aproveitar os volumes armazenados. Constatou-se também, que a Área 2, como um todo, apresentou uma boa pontuação.

A partir dessa seleção prévia, a sub-bacia C da Área 1 foi selecionada para uma análise mais específica, discriminando-se as tipologias de ocupação/pavimentação que compõem a bacia: áreas de ruas e passeios, ruas internas e lotes. A área dos lotes foi segregada em área de telhado e área não edificada, conforme a Figura 4.

Figura 4. Áreas componentes da sub-bacia C da Área 1. Região da Tijuca, Rio de Janeiro, Brasil, 2018

Figura6

Fonte: Os próprios autores (2018)

A quantificação das áreas das tipologias identificadas está apresentada na Tabela 2.

Tabela 2. Detalhamento das áreas que compõem a sub-bacia C da Área 1. Região da Tijuca, Rio de Janeiro, Brasil, 2018

Figura7

Fonte: Os próprios autores (2018)

Constata-se que as áreas de telhados representam cerca de 55% de sua área total (e 70% de sua área loteada), demonstrando alto grau de impermeabilização e grande capacidade de interceptação/captação de águas meteóricas nas coberturas. Tais aspectos ratificam a escolha dessa microbacia como de bom potencial para a implantação de microreservatórios.

Também foram identificadas na sub-bacia C (Área 1) diversos casos de edificações que dispõem de condições apropriadas para a implementação de sistemas de armazenamento de água de chuva nos lotes. O prédio localizado na Rua dos Artistas (Figura 5) é um exemplo de edificação que se enquadra nos critérios de seleção, dispondo de lote com área superior a 500 m², grande área individual de telhado (superior a 40% da área total), além de pavimentos destinados à garagem e extensa área verde/convivência, portanto, mais propenso a utilização (reuso) da água armazenada.

Figura 5. Edifício localizado na Rua dos Artistas da sub-bacia C da Área 1. Região da Tijuca, Rio de Janeiro, Brasil, 2018

Figura8

Fonte: Street View (2018).

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

Com base nos resultados do presente trabalho, realizado a partir de estudo de caso do município do Rio de Janeiro, mais especificamente de uma região urbana consolidada e bastante impermeabilizada como a Tijuca, pode-se depreender que:

(1) Entre os critérios que potencializam a viabilidade de amortecimento através de retenção de águas de chuva em áreas particulares podem ser destacados: a) a existência de elevada área disponível de coberturas de telhados (preferencialmente com maiores superfícies em um número menor de lotes); b) a não contribuição de bacias externas para a área/sub-bacia em estudo; c) a saturação dos sistemas de drenagem existentes; e d) a existência de demanda de reuso da água armazenada;

(2) A metodologia proposta para a hierarquização de microbacias possibilitou estabelecer prioridades em relação à avaliação e escolha de áreas para a implementação da técnica de microreservatórios intralotes, com o objetivo de amortecer picos de cheias, e, secundariamente, reusar a água de chuva armazenada;

(3) A partir da análise de uma das áreas classificadas como prioritárias (sub-bacia C), foi possível identificar a existência de vários exemplos de edificações possuidoras de características desejáveis para o emprego de sistemas de amortecimento na origem, de acordo com os critérios definidos na metodologia adotada.

Como recomendações para a continuidade da pesquisa, considera-se da maior importância o aprofundamento dos estudos hidrológicos e hidrodinâmicos, de modo a simular os cenários com e sem a implantação de reservatórios de amortecimento. O desenvolvimento dos estudos também permitirá o detalhamento, retificação e/ou ratificação de algumas premissas ora adotadas, como a porcentagem mínima de área de telhado em relação à área total do lote.

Dentre as condições de contorno adotadas, algumas poderão ser consideradas mais importantes do que outras de acordo com o objetivo proposto. Dessa forma, em futuros estudos, é interessante refinar a metodologia no que se refere aos pesos atribuídos aos critérios de escolha, de maneira a proporcionar uma melhor hierarquização das bacias/sistemas a serem avaliados.

Tendo em vista a existência de edificações que já dispõem de microreservatórios em atendimento à legislação municipal, ressalta-se que é preciso realizar um levantamento do cadastro dessas construções e da realização de modelagens de forma a possibilitar a avaliação do seu funcionamento, dando subsídios para o aperfeiçoamento da aplicação dessa tecnologia.


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Recebido: 20 fev. 2018

Aprovado: 31 out. 2018

DOI: 10.20985/1980-5160.2018.v13n4.1393

Como citar: Ohnuma Jr, A. A.; Obraczka, M.; Silva Jr., L. C. S. et al. (2018), “Metodologia para seleção de microbacias de drenagem urbana para implantação de microreservatórios: estudo de caso da bacia da Tijuca, RJ”, Sistemas & Gestão, Vol. 13, No. 4, pp. 458-468, disponível em: http://www.revistasg.uff.br/index.php/sg/article/view/1393 (acesso dia mês abreviado. ano).