Análise de riscos ergonômicos entre serventes durante a execução de fundações

Flávia Souza Oliveira

flavia.tsteng@hotmail.com

Faculdades Integradas do Norte de Minas - FUNORTE, Montes Claros, Minas Gerais, Brasil

Emmanuella Silva Viana

emmanuellaviana@hotmail.com

Faculdades Integradas do Norte de Minas - FUNORTE, Montes Claros, Minas Gerais, Brasil

Fabrícia Souza Oliveira

fabricia.neware@yahoo.com.br

Faculdades Santo Agostinho - FASA, Montes Claros, Minas Gerais, Brasil

Kimberly Marie Jones

kimberly.jones@funorte.edu.br

Faculdades Unidas do Norte de Minas - FUNORTE, Montes Claros, Minas Gerais, Brasil


RESUMO

Esta pesquisa teve como objetivo avaliar os riscos ergonômicos aos quais estão expostos os serventes durante a execução de fundações, em um canteiro de obras. Caracterizou-se como um estudo exploratório-descritivo e quantitativo. Os resultados permitiram verificar a precariedade de tecnologias voltadas para as atividades laborais executadas pelos serventes. Sugere-se, pois, às empresas de construção civil adotar medidas economicamente viáveis para minimizar os riscos ergonômicos aos quais estes profissionais estão expostos, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida no trabalho bem como o aumento da produtividade organizacional.

Palavras-chave: Risco Ergonômico; Servente; OWAS; Fundações.


INTRODUÇÃO

No cenário da economia brasileira, o setor da construção civil destaca-se por sua relevância no quesito empregabilidade. De acordo com IBGE (2011), este setor é responsável por empregar um número progressivo de trabalhadores quando comparado aos anos anteriores. Evidencia-se que no ano de 2011 foram empregados cerca de 2,7 milhões de trabalhadores, número superior aos 2,5 e 1,6 milhões de colaboradores empregados neste mesmo setor nos anos de 2010 e 2007, respectivamente.

No entanto, fundamentando-se no Serviço Social da Indústria (SESI, 2008), verifica-se que a atividade desenvolvida por tal setor é considerada perigosa e expõe os trabalhadores a diversos riscos ocupacionais, com especificidades e intensidades que dependem do tipo da construção analisada, da etapa da obra e da forma de condução dos programas e ações de segurança e saúde no trabalho.

Define-se riscos ocupacionais como aqueles decorrentes da organização, dos procedimentos, dos equipamentos ou máquinas, dos processos, dos ambientes e das relações de trabalho, que possam comprometer a segurança e a saúde dos trabalhadores, dependendo de sua natureza, concentração, intensidade e tempo de exposição. Classificam-se em cinco categorias: físicos, químicos, biológicos, ergonômicos e de acidentes (SESI, 2008).

Para efeito deste estudo foram abordados os riscos ergonômicos, uma vez que é um dos riscos laborais mais frequentes nos canteiros de obras e, além de atingir praticamente todos os trabalhadores da construção civil, afeta principalmente os serventes, sujeitos desta pesquisa (Araújo et Meira, 1996). Ademais, no contexto das Obras de Fundações, verifica-se que tais atividades se classificam como grau de risco máximo no quesito saúde e segurança do trabalhador, tal como aponta o anexo I da Norma Regulamentadora que discorre sobre os Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (NR-4) (Brasil, 2011).

Nessa perspectiva, o presente artigo tem como objetivo analisar os riscos ergonômicos aos quais estão expostos os serventes durante a execução de fundações do tipo estaca escavada e com bloco, já que, dentre os trabalhadores atuantes no setor da construção civil, são os colaboradores mais expostos aos riscos de lesões dessa natureza, portanto, analisou-se detalhadamente todas as posturas assumidas por eles em atividades previamente definidas inerentes à etapa de fundação.

Esta pesquisa foi realizada em um canteiro de obras localizado na cidade de Montes Claros, situada no norte do estado de Minas Gerais, Brasil. É relevante salientar que Montes Claros é a única cidade média do norte de Minas e caracteriza-se como cidade polo ao desempenhar funções em torno de serviços, comércio e indústria (França et al., 2009). E, segundo dados do IBGE (2010), conta com uma população de 361.971 habitantes.

Neste contexto, tal cidade insere-se na região Sudeste, que é justamente a detentora de liderança em termos de pessoal ocupado e valor das incorporações, obras ou serviços do setor, segundo a Pesquisa Anual da Indústria da Construção (IBGE, 2011). Assim, esse estudo justifica sua localidade na região Sudeste e define a cidade de Montes Claros/MG como cenário de pesquisa.

Logo, é possível verificar a pertinência do presente estudo, uma vez que, por meio deste, poder-se-á conhecer as condições ergonômicas reais aos quais estão expostos os serventes durante a execução de atividades pertinentes a etapa de fundação, bem como buscar soluções que visem minimizar tais riscos e garantir, por conseguinte, qualidade de vida no trabalho e aumento da produtividade organizacional.

QUADRO TEÓRICO

Ergonomia: história e conceito

De acordo com Iida (2005), a ergonomia surgiu após a II Guerra Mundial, a partir de um trabalho interdisciplinar efetivado por diversos profissionais, tais como engenheiros, fisiologistas e psicólogos. Ao contrário das outras ciências, evidencia-se que a ergonomia possui uma data "oficial" de nascimento: 12 de julho de 1949. Esse dia marca a primeira reunião - Inglaterra-, de um grupo composto por cientistas e pesquisadores interessados na discussão e formalização da existência desse novo ramo de aplicação interdisciplinar da ciência.

Entretanto, apesar de se ter uma data precisa quanto ao surgimento oficial da ergonomia, denota-se que a mesma foi precedida por um longo período de gestação, que remonta à pré-história. Começou provavelmente com o primeiro homem pré-histórico na escolha de uma pedra cujo formato se adaptasse melhor à forma e movimentos de suas mãos, de modo a usá-la como arma. Dessa forma, as ferramentas confeccionadas proporcionavam poder e facilitavam tarefas, tais como caçar, cortar e esmagar. Explicita-se que a ergonomia consiste em um estudo que visa adaptar o trabalho ao homem, de forma a ajustar aquele às capacidades e limitações deste (Iida, 2005).

Segundo Martins et al. (2017, p. 271), a ergonomia é definida como uma “ciência que visa modificar os sistemas de trabalho para adequar as atividades neles existentes às características, habilidades e limitações dos trabalhadores, de modo a proporcionar um desempenho eficiente, confortável e seguro”.

A norma regulamentadora que discorre sobre a ergonomia (NR-17) dispõe que ela visa proporcionar conforto, segurança e o bom desempenho dos trabalhadores através da adoção de parâmetros que permitam a adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos mesmos (Brasil, 2011).

Aponta-se que o desempenho produtivo de uma organização depende das condições ergonômicas, uma vez que as mesmas visam promover a segurança, saúde e satisfação dos colaboradores de forma a reduzir a fadiga, erros, estresse e acidentes. Portanto, além de proporcionar melhor qualidade de vida no trabalho, a aplicação de métodos ergonômicos faz-se essencial, visto que através da redução da taxa de absenteísmo, do aumento da produtividade e qualidade do produto, a organização obterá um crescente desenvolvimento, de forma a tornar-se competitiva e alcançar o sucesso no mercado (Marques et al., 2010).

A partir disso, fica evidente que a ação ergonômica em qualquer empresa tem como função entender e delinear o sistema produtivo a fim de proporcionar ao trabalhador a realização de suas tarefas de modo seguro e competente, no tocante às suas capacidades mentais e físicas (Rodrigues et al., 2013; Gomes et al., 2017).

Construção civil: fundações

Segundo Peinado et al. (2013), o aumento populacional e o crescimento das cidades brasileiras desencadearam uma crescente demanda por habitações, o que ocasionou em um incentivo maior à construção de edificações de grande porte, culminando no aquecimento do setor de construção civil, responsável pela geração de milhares de empregos no Brasil.

Ainda com as atuais ações e medidas mitigadoras adotadas por parte do governo e dos empregadores, denota-se uma considerável incidência de acidentes do trabalho bem como de doenças profissionais, representando números significativos no âmbito da construção civil nacional (Medeiros, 2016).

No contexto da indústria da construção civil, ressalta-se que a mesma requer de seus colaboradores a realização de tarefas bastante árduas, além de outros fatores peculiares ao setor, tais como o pequeno índice de treinamento dos trabalhadores, o baixo nível de escolaridade, a utilização do sistema terceirizado de empregabilidade, as baixas remunerações e a falta de programação das ferramentas para execução das atividades. Dessa forma, percebe-se que a ergonomia se faz extremamente necessária para a minimização dos riscos laborais bem como a manutenção da integridade física e mental destes colaboradores (Saad et al., 2006).

Em se tratando do ramo de edificações, verifica-se que, durante o processo construtivo, ocorre uma contínua modificação das atividades, do ambiente e dos trabalhadores, uma vez que os serviços inerentes a cada etapa são efetuados por diferentes empreiteiras. Dentre as etapas de tal produção, destacam-se: fundação, estrutura/alvenaria e acabamento (SESI, 2008).

Para a realização do presente trabalho, fez-se necessária a abordagem da etapa de fundação, já que é parte fundamental das obras de edificações e caracteriza-se por suportar todo peso do prédio e se apoiar na parte sólida do solo. Diante disso, evidencia-se que as características do projeto e do terreno são de fundamental importância para a determinação do tipo de fundação a ser adotada (SESI, 2008).

Para tanto, aponta-se a existência do anexo I da NR, que discorre sobre os Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho, que considera obras de fundações, de acordo com a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (43.91-6), como grau de risco quatro, isto é, o maior grau de risco no quesito segurança (Brasil, 2011). Tal classificação justifica-se pela grande complexidade em se fazer uma análise adequada das possíveis medidas e concretização dos planos de prevenção de acidentes nas atividades realizadas nesta fase, dado que, de acordo com o tipo de fundação executado, a realização de trabalhos em espaços confinados no serviço de alargamento de bases dos tubulões, por exemplo, apresentam altos índices de riscos de acidentes laborais (Peinado et al., 2013).

Doenças ocupacionais

A constituição física do ser humano responde de forma diferente aos estímulos físicos de acordo com o local onde a atividade está sendo realizada. O que leva a deduzir que, a falta de conforto no ambiente laboral pode ocasionar além do desconforto, vários tipos de doenças ocupacionais, comprometendo a segurança e a qualidade de vida do trabalhador (Paiva et Santos, 2012).

De acordo com Saad (2008) e Bezerra (2015), o desenvolvimento das atividades no canteiro de obras exige constantemente a execução de movimentos repetitivos e o manuseio de cargas, caracterizando um trabalho pesado, o que ocasiona o uso excessivo da musculatura e a consequente ocorrência de doenças ocupacionais. Nesse contexto, destacam-se os distúrbios osteomusculares que estão intimamente ligados às atividades fracionadas, repetitivas, sem qualificação e inadequadas ou impróprias às condições de trabalho humano. Vinculadas ao objetivo de maior produtividade, é exigido dos operários um ritmo acelerado durante a execução das tarefas, sendo desprovido de um diálogo ou questionamento entre os operários e a organização, caracterizando também um gerenciamento opressor (Martins Junior et Saldanha, 2009).

Desse modo, verifica-se que a incompatibilidade entre as capacidades físicas do colaborador e as exigências do trabalho executado são responsáveis pela ocorrência dos traumas musculares. Portanto, tais traumas são causados basicamente pelo impacto e esforço excessivo durante a realização da tarefa (Iida, 2005).

Ainda segundo Iida (2005), o trauma por impacto ocorre em uma região específica do corpo, que é atingida por uma força súbita em um pequeno intervalo de tempo, podendo causar contusões e sérios traumatismos exemplificados por fraturas ósseas e lacerações de tecidos. O trauma relativo ao esforço excessivo, por sua vez, ocorre na realização física da tarefa, quando da exigência de força excessiva e movimentos inadequados do corpo.

Ante ao exposto, este estudo adota como área de abrangência o trauma relativo ao esforço excessivo, uma vez que é a principal causa de afastamentos de colaboradores, em consequência das lesões musculoesqueléticas e doenças. Esse tipo de trauma provoca diferentes lesões, como as compressões nervosas, os distúrbios lombares, as tendinites e tenossinovites (Iida, 2005). Também se enquadram nesta classificação as lesões promovidas por traumas repetitivos, quais sejam (Iida, 2005, p. 164): os distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT); as lesões por traumas cumulativos (LTC); e as lesões por esforços repetitivos (LER).

A sigla DORT é mais abrangente e inclui as LTC e LER.

Aponta-se que as lesões ocupacionais afetam a saúde física e mental do trabalhador, reduzindo sua capacidade funcional, interferindo de forma direta na produtividade e na qualidade de vida do colaborador (Saad, 2008).

MATERIAIS E MÉTODOS

Esta pesquisa consistiu em um estudo exploratório-descritivo, de abordagem quantitativa, realizada com serventes envolvidos diretamente nos trabalhos voltados para execução de fundações, do tipo estaca escavada e com bloco, em um canteiro de obras, na cidade de Montes Claros, situada no norte do estado de Minas Gerais, Brasil.

Para concretização desta pesquisa, o projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) das Faculdades Unidas do Norte de Minas (FUNORTE) e aprovado em março do ano de 2014, pelo Parecer 567367.

Ressalta-se que, por se tratar de uma pesquisa que envolveu seres humanos, está em conformidade com a Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012, do Conselho Nacional de Saúde, que preceitua o respeito à bioética, aos princípios de autonomia, não maleficência, beneficência e justiça dos seres humanos (Brasil, 2012).

Assim, todos os serventes (100%) receberam o termo de consentimento livre e esclarecido para a participação da pesquisa, concordaram em participar dela e responderam o questionário proposto (abril/2014).

O instrumento de coleta de dados foi aplicado a 100% dos sujeitos da pesquisa, consistindo em questionário, constituído por sete questões objetivas, que caracterizavam o perfil dos sujeitos deste estudo. Além disso, foram feitas observações, fotos e filmagens dos serventes durante a execução de fundações, de forma a detalhar e enumerar precisamente as tarefas executadas pelo universo pesquisado e as principais posturas assumidas pelos sujeitos da pesquisa durante a realização das mesmas.

Os dados coletados foram analisados em maio de 2014, quando foram codificados, tabulados e calculados estatisticamente e apresentados em forma de gráficos, analisando-se o conteúdo dos questionários aplicados bem como os resultados obtidos através do software Ergolândia (Versão 5.0) pelo método Ovako Working Posture Analysin System (OWAS).

De acordo com Iida (2005), o método OWAS foi criado para se obter informações para melhorar os métodos de trabalho por identificar posturas corporais inadequadas adotadas pelos trabalhadores. Assim, para tal método foram feitas observações onde se considerou, para cada etapa identificada, as posturas relacionadas às costas, braços, pernas, utilização de força ou carga e a fase da atividade analisada. Verifica-se que tal método é utilizado para registro das posturas, sendo que cada postura é descrita por um código de quatro dígitos, conforme representadas na Figura 1.

Figura 1. Código de posturas – método OWAS

Figura

Fonte: Dados da pesquisa (2014)

Assim, foi preenchido o banco de dados do software Ergolândia Versão 5.0 no módulo OWAS de acordo com as posturas identificadas em cada etapa e obteve-se como resultado a categoria de ação de cada etapa, que identifica se são necessárias medidas preventivas ou não, tal como exemplifica a Figura 2.

Figura 2. Banco de dados – método OWAS

Figura

Fonte: Dados da pesquisa (2014)

Verifica-se que tais categorias a serem encontradas classificam-se por códigos pelos quais são identificados os respectivos níveis de ação, tal como é descrito na Tabela 1, abaixo.

Tabela 1. Descrição das categorias de ação – Método OWAS.

Figura

Fonte: Dados da pesquisa (2014)

RESULTADOS

Perfil geral dos trabalhadores

Inicialmente foi realizada uma pesquisa para verificar o perfil geral dos trabalhadores estudados, sendo aplicados questionários e realizadas observações diretas no local estudado. Dessa forma, verificou-se que o canteiro de obras possui 110 funcionários distribuídos nas funções de encarregado, servente, pedreiro, bombeiro hidráulico e eletricista, sendo que eles executam sua jornada de trabalho das 7:00 às 12:00 e das 13:00 às 17:00.

O questionário aplicado aos serventes visou caracterizar os sujeitos da pesquisa e identificar as principais queixas dos serventes quanto aos riscos ergonômicos encontrados na execução de suas atividades e as medidas adotadas pela empresa nesse contexto.

Em síntese, conforme a Figura 3, os resultados da pesquisa demonstram que a maioria dos trabalhadores analisados é jovem e de média idade, havendo poucos trabalhadores com mais de 50 anos. Esse fato sugere que a atividade seja um atrativo aos jovens que iniciam no mercado de trabalho e que possibilita a permanência de trabalhadores, ainda que pequena, de profissionais com idade mais avançada.

Figura 3. Faixa etária

Figura

Fonte: Os próprios autores

Outro ponto relevante é que há um balanceamento em relação ao tempo de experiência na função, visto que metade do número de trabalhadores estudados tem menos de dois anos na função e a outra metade tem mais de dois anos, ressaltando a afirmação anterior, de atrativo aos jovens e profissionais de idade mais avançada. Todos os trabalhadores são do sexo masculino e de baixo nível de escolaridade, uma vez que são analfabetos ou possuem, no máximo, o segundo grau de instrução.

Análise biomecânica

Problemas ergonômicos e medidas adotadas

Observou-se que a maioria dos trabalhadores se queixa quanto ao emprego de esforço físico intenso, levantamento e transporte manual de cargas, exigências de posturas inadequadas e repetitividade na execução de suas atividades. Dessa forma, fica evidente a caracterização do trabalho realizado na construção civil enfatizada no presente artigo, uma vez que envolve tarefas árduas e despende grande esforço físico do colaborador. Ademais, verificou-se que 92% dos trabalhadores apontam o levantamento e transporte manual de peso como risco identificado em suas atividades, além do esforço físico intenso e exigências de posturas inadequadas citados por 67% e 58% dos trabalhadores, respectivamente. Além desses riscos identificados de forma expressiva, foram citados, também, ainda que por menor número de trabalhadores, o controle rígido de produtividade, imposição de ritmos excessivos, monotonia e repetitividade, tal como mostra a Figura 4.

Figura 4. Riscos identificados pelos serventes

Figura

Fonte: Os próprios autores

Resultados do método OWAS

Segundo Iida (2005), a análise da categoria de ação se dá em função da combinação de quatro variáveis. Para tanto, visando lançamento de dados no software Ergolândia, fez-se necessária a descrição das etapas sequenciais no processo de execução das fundações analisadas (Figuras 5) e, por conseguinte, a identificação das posturas adotadas e carga manipulada pelos serventes na respectiva etapa, a partir das fotos e filmagens feitas no canteiro de obras. Dessa forma, foram atribuídos os códigos das posturas identificadas em cada atividade, conforme a Tabela 2.

Figura 5. Etapas identificadas na execução da fundação analisada

Figura

Fonte: Os próprios autores (2014)

Tabela 2. Código das posturas em função do método OWAS

Figura

Fonte: Dados da pesquisa (2014)

Evidencia-se que em cada etapa foram atribuídos quatro dígitos em função da postura adotada para execução das atividades. Os dígitos seguem a sequência: postura das costas, postura braços, postura das pernas e esforço necessário. Assim, com a combinação dos quatro códigos de cada atividade inseridos na tabela de ação, obtiveram-se as categorias de ação para cada etapa descrita na Tabela 3.

Tabela 3. Categoria de ação em função das posturas – OWAS

Figura

Fonte: Dados da pesquisa (2014)

Denota-se, a partir da tabela acima, que das sete etapas de trabalho identificadas, a limpeza de tubulões e o transporte de cargas para regularização de base se enquadram na categoria máxima de ação, acompanhadas de mais quatro atividades classificadas na categoria. De tal modo, faz-se necessária a adoção de medidas de forma a corrigi-las imediatamente ou em um futuro próximo, respectivamente.

DISCUSSÃO

Em se tratando do perfil do trabalhador estudado ratificou-se, por meio do questionário aplicado, que a maioria dos trabalhadores é jovem e de meia idade, caracterizando esse tipo de atividade como um atrativo pelos jovens e que há um pequeno número de trabalhadores acima de 50 anos. Neste estudo foi identificada uma predominância em relação ao tempo de experiência em tal função: menos de dois anos para metade dos trabalhadores.

Evidenciou-se, ainda, que todos os pesquisados são do sexo masculino com baixo nível de escolaridade, analfabetos ou, no máximo, o segundo grau completo. Essas características estão de acordo com o exposto no contexto da indústria da construção civil, em que se identificam trabalhadores com pequeno índice de treinamento e baixo nível de escolaridade. Esse cenário também é caracterizado por baixas remunerações e falta de programação com as ferramentas de trabalho, ocasionando riscos laborais. Por isso, exige o desenvolvimento da ergonomia a fim de minimizar esses riscos para, por consequência, manter a integridade física e mental do trabalhador, tal como abordado por Saad et al. (2006).

Também foi possível avaliar as reclamações dos trabalhadores, principalmente em relação aos esforços físicos intensos aplicados no transporte manual e levantamento de cargas, dispondo de posturas inadequadas e repetitivas. Tais atividades, como afirma por Saad (2008), obrigam a realização de esforços repetitivos e o manuseio de cargas que levam ao esforço excessivo da musculatura, ocasionando doenças ocupacionais, principalmente os distúrbios osteomusculares.

Reafirmando o exposto anteriormente, foi avaliado que 92% dos trabalhadores apontaram o levantamento e transporte manual de peso como a maior agravante em suas atividades, seguida dos esforços excessivos, com 67%, e posturas inadequadas, com 58%. Ressalta-se como outra agravante o controle rígido de produtividade, identificado por 50% dos serventes. De acordo com Martins Júnior et Saldanha (2009), quando se almeja uma maior produtividade, exige-se dos operários um ritmo acelerado durante a execução de atividades, o que caracteriza um gerenciamento opressor, pois há ausência de qualquer questionamento ou diálogo entre servente e empresa. Outro resultado foi a presença de imposição de ritmos excessivos, como monotonia e repetitividade, identificados por 8% dos participantes da pesquisa, considerado o menor devido ao pequeno número de funcionários.

Como resultados da análise do software, reconheceram-se categorias de ação definidas a partir das posturas de coluna, braços e pernas assumidas, concomitantemente, com as cargas durante transporte e manipulação. As categorias de ação foram as seguintes: “são necessárias correções tão logo quanto possível”, “são necessárias correções em um futuro próximo” e “são necessárias correções imediatas”, sendo a última a mais grave. No processo de execução cujas etapas dividiram-se entre escavação de blocos, limpeza de tubulões, regularização de base, concretagem de blocos e transporte de cargas, verifica-se um destaque da limpeza dos tubulões e do transporte de cargas durante a regularização da base, uma vez que são as etapas mais prejudiciais à ergonomia dos funcionários, necessitando serem corrigidas imediatamente. Assim, como ressalta Iida (2005), o método OWAS possibilitou a identificação de posturas corporais comprovadamente inadequadas para os trabalhadores, com necessidade de correção.

CONCLUSÃO

Essa pesquisa comprovou que são árduas as atividades desenvolvidas pelo servente no canteiro de obras durante os serviços de fundações, bem como os riscos ocupacionais que os acometem de acordo com as categorias de ação resultantes da análise no software Ergolândia (OWAS). A partir dos resultados obtidos, verificou-se a necessidade de implantação de melhorias como resultante da observação da gravidade das posturas assumidas.

É pertinente ressaltar que esta pesquisa se restringe apenas ao canteiro de obra estudado cuja etapa de fundação, definição de seu tipo e forma de execução dependem de vários fatores, como solo, especificações técnicas, logística, custos, além de fatores esporádicos e imprevisíveis característicos dessa etapa. Cada empresa adota medidas diferentes com relação ao tratamento e preocupação com seus funcionários, portanto, os resultados somente se aplicam ao cenário do estudo, já que não se abrangeu as medidas de segurança adotadas aqui para todos os canteiros de obras da cidade de Montes Claros – MG.

Diante da situação estudada, verificou-se a precariedade de tecnologias voltadas para as atividades laborais executadas pelos serventes, uma vez que quase todos os serviços realizados por eles são de forma braçal, levando ao crescente aparecimento de distúrbios osteomusculares.

Com a presença de uma tecnologia voltada para essa classe seria possível, direta e indiretamente, evitar várias outras agravantes. A princípio seria perceptível um rendimento durante as atividades, já que os obreiros desempenhariam menos os seus esforços durante as atividades, tendo uma maior produtividade. Isso levaria a um decréscimo de afastamentos por conta de doenças ocupacionais, reduzindo os custos com tratamentos médicos e mão de obra não produtiva.

No âmbito social, a eficiência das tecnologias teria um reflexo nos serviços de saúde, pois o número de internações e filas para atendimento também seria reduzido, minimizando gastos do Estado e o desgaste profissional, psicológico e físico por parte do trabalhador. Melhorar a qualidade de vida da classe seria a melhor estratégia para a sociedade, pois, tanto empresa, como o servente, o sistema de saúde e toda a sociedade receberiam os benefícios.


REFERÊNCIAS

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Recebido: 06 jan. 2016

Aprovado: 18 jan. 2018

DOI: 10.20985/1980-5160.2018.v13n1.1128

Como citar: Oliveira, F. S., Viana, E. S., Oliveira, F. S. et al. (2018), “Análise de riscos ergonômicos entre serventes durante a execução de fundações”, Sistemas & Gestão, Vol. 13, No. 1, pp. 36-44, disponível em: http://www.revistasg.uff.br/index.php/sg/article/view/1128 (acesso dia mês abreviado. ano).